Magnificências... (completo)

Encontra-se,

Em nostálgico horizonte,

O perfume de uma voz violácea;

A intuição da ígnea flor,

Por um céu áqüeo-flavescente,

Ainda encanta-se

Acariciada pelo sabor cromático

De uma fragrância musical...

I

Era através do sono que ele se mantinha bem acordado, desperto qual atento olhar dos que dormem de ouvidos vestidos em nudezas de jardins e quintais quase extintos. Tão macio quanto o diamante sonhando com a vigília dos espíritos do fogo; numa amável manhã sutilmente anoitecida podia-se ouvir as cálidas cores de um nostálgico entardecer...

Mas a emoção de um céu áqüeo-flavescente lembrava o

suspirar e o carisma de um vibrante sabor...

Entrevia-se, em meio aos cisnes do Nascente, algo que somente o coração de um contemplar ingênuo podia ouvir, ver e sentir...

Era o perfume de uma voz violácea...

II

Eram duas borboletas... Sim, elas teciam teias, mas depois iam dormir em seus pequenos lares ósseo-espiralares... Despetalavam o mistério da Lua, tornando-a celebridade incólume... Por estreitos orifícios atravessavam os seus sons estuosos, a preencher opérculos de sonhos, defluindo cores entardecidas como num ruivo horizonte... Tudo se fragmenta em instantes que, inseguros pelo Ar, abrem as asas e se perdem numa volátil percepção; seus ardores terminavam em uivos vertiginosos tateados em tons de verde e afogueados em suas inflorescências sentimentais...

Ametistas implumes ladeavam o álveo atrás de uma irmandade de flores crisálidas enaltecidas em estação oculta pelo azul de suas meditações e pela transparência que evidenciava o segredo de sua criptogamia melódica... Nasceria um invólucro de luz especial para conceber a pureza do lago crescente? Sonho brônzeo-crepuscular?

Os Urutagos, disfarçados de galhos, parecem plangentes com o concavar de seus sinistros sorrisos... Sabiam que a mancha amarelada na face interna da escuridão da Noite era o Dia derramando pelo profundo entalho feito por olhares incisivos que ansiavam por anteceder o Amanhã... Escorria essências de antigas alvoradas, o que era uma evasão para o outro lado do Etéreo... Elas exalavam a silenciosa tranqüilidade de uma rubefação...

Gotas ígneo-incandescentes foi o elixir dos girassóis de inato lúmen sempre que erguidos para o lúcido brilho dessas cachoeiras ainda meninas; jovens águas que possuíam muito tempo condensado em despreocupações. Moviam-se tais que acentuavam o lilás de seu entusiasmo... Mais tarde observam evaporar solenemente, para o vácuo da Inexistência, a rigidez de um ruído não mais vistoso e agradável aos seus sublimes olfatos...

III

A Alegria, com seu olhar de criança, abria suas tenras mãos, deixando cair, no precipício de tudo o que não é preciso, as suas menos importantes vontades, só para, quando caíssem lá embaixo, ouvir o impacto de sua liberdade e logo poder correr para ver beija-flores violetas pairarem diante de sua angelitude...

Somente ela sabia quais gostos tinham as estradas do arco-íris... Perto de onde morava sentia que a maciez de uma emoção dourada acolhia uma fragrância musical... Menina extra-sensorial...

Sentia na língua e nos lábios os significados que mais amava, bem como em sua memória ela podia ver todas as músicas que pelos seus ouvidos um dia entraram... Passaram a existir em forma de imagens de riquíssimas colorações e arranjos estéticos; suas mãos também podiam senti-las quando imersas em águas fecundas ou acariciadas por crisântemos de asas lácteo-cupidinosas...

IV

Num jardim de campânulas róseas, inclinavam-se para uma lagoa de lembranças odoríferas, momentos mais que eternos para quem conhecia a paz das águas onde moravam segredos submersos em inusitada luminescência e dinâmica ainda desconhecida na superfície das profundezas físicas e alquímicas...

Mas quem era capaz de compreender a natureza daquele fenômeno dos sentidos? Na hora em que, dócil e lentamente, se recolhiam as luas aquáticas acontecia sob o verdor da úmida mata

a áspera alvura de uma orquestração de odores...

Então se iam, para o lado oculto da Terra, os riachos minguantes de espelhamentos vítreo-prismáticos; mesmo antes parados, tão azuis e esverdeados projetavam no céu da encosta auroreal as suas estrelas de algas prateadas, a maioria procurando o Sol, e algumas apontando para o prenúncio de um moroso crepúsculo...

Quando um arranjo de estrelicias e tulipas nos pés de um cipreste participava de orvalhada ensonhação enquanto a canção do Tempo aveludava numa aconchegante paciência de pássaros brancos em suaves contornos níveo-esculturais, a magnificente ternura de uma dama que se preocupava com suas púrpuras florações, ensinava o respeito e o essencial para os nobres arvoredos ainda brotos com duas ou cinco folhas já existindo em seu víride esplendor...

V

Melífluo gemido da brisa move as melenas douradas do anjo que colhe frutos flavos debaixo de um céu de nuvens escarlates com dúbios horizontes de cereja... Já quase anoitecendo com o enflorar dos calmos afluentes e dos vaga-lumes crisófilos, os murmúrios licorosos das umbelas de androceus safirados misturavam-se com o índigo matiz do flúmen cercado de sapos que amadureciam em viscos e devaneios mírreo-afrodisíacos...

Delambiam-se as rosas aracnídeas que restaram da antiga estação; lembrava um outono com algumas pequenas primaveras grudadas em veios tal qual sinântea graça...

As rumorosas folhas répteis sempre ondularam próximas do vale esquecido... Lá por onde as meninas de semblantes rúbidos desciam para remover hortelãs numa tarde mentolada de cor amarela e pintas ferruginosas em longínquas imensidões...

No limiar da Existência a rúbeo-flamejante despedida do Sol endereçava os sonhadores há um tempo que também disse adeus; seu significado em síntese cromática recendia em solidezes cada vez mais flexíveis e gradativas em seu magno escurecer...

Doces sonhos as seguiam para sentirem seus cheiros rosáceos, aromas afetivos enquanto delírio cutâneo, e apenas arroxeavam seus desejos acasulados com a coragem das flores que um dia foram, pela escola dos pássaros, majestosamente calópteras... Suas verdades eram repetidas copiosamente por camaleões que habitavam secretos cristalíferos onde retornavam para o reflexo de suas sensações...

A tranqüila chuva convida a memória para um passeio por entre quintais cítreo-rubescentes; visto que a tênue luz do poente laranja, no entanto as beijavam... Via-se, de longe, o assobio perfumoso de duas intuições veludíneas... Chove apenas em sonhos azulinos... E as gotas chovem por dentro também... Sonham com o Apenas...

VI

Beijos flóreo-celestiais se abriam em brumas finíssimas, quase despiam a inocência das rubras aragens que eram sempre ouvidas por entidades jamais indiferentes para com os detalhes naturais...

Não se podia medir a dimensão aquosa do oásis se ele estivesse em fase nova; esperava o início de seu clarificar; no escuro ocultava a umbrosa convenção das rãs cuja sinfonia salgava o espiar de um balsâmico ardor escorregadio...

Continuava nas curvas sonoras da montanha uma fileira de arbustos cárneo-uivantes; logo subia para os subterrâneos do cimo as verbosas astúcias vulpinas... Suas peles fulvas e farfalhantes eram afagadas por uma flagrante espécie de bromélias de mãos zelosas conduzidas pelo ramo sensível da vontade que alastrando-se tornava íntegro seu tato ecoante e enigmático...

Bailarinos copos de leite reluzem como cálices de estrelas, uma luz morna canta com vigor e atravessa seus caules opacos que por tão transparentes gotejam; sabe-se que outrora lacrimejavam doçuras transmudadas em substâncias de frescores mais preciosos... Mais amplos e amigos do genuíno... De plúmbeo-obscurecidas que eram... Apenas singelos traços em contraste com a predominante e enfática vocalização do ouro... Naquele sentido, seiva de pinheiros assumia o valor do mel e as amargas esperas em chegadas sem véus...

VII

Embebia-se numa avidez flâmeo-sensorial as orquídeas felinas que faziam o coral das claridades afáveis em ventos de sândalo em noites de luar amarelecido; às medidas não seria uma elipse o círculo perfeito que se expandia emoldurando a Lua mais tarde doirada...

Surgiu um coelho que, por estar molhado, levava consigo a areia colorida de um caminho por onde voltava de um dos mais puros e silenciosos aqüíferos transcendentais das regiões bucólicas que habitava jamais desencontrando do viver pacífico...

Beleza que adoça o olhar dos campos de trigais rubificados, era a luz própria que emitiam as flores noturnas; acesas com mais vigor em seus atos maternos de protegerem seu segredo óveo-primordial; uma delas que tornou-se árvore ilumina a passagem de uma gruta de galerias guardadoras de mares antigos; por menores ante os demais deslocaram-se a um novo e consonante destino quando livres para fluírem fartos em variedades písceo-cavernosas...

Amoras despertavam amarugens rúbeas e arrepios fonéticos tão recendentes; Era o alimento da virente força dos gafanhotos cítricos que circundavam os montes pétreo-cricrilantes... Rumores roxos acariciavam a afeição das cores que se calavam em fascínios internos para poderem ouvir levezas somente pela própria verdade...

VIII

Devaneios Nostálgicos... Nos lábios erógenos das margaridas que avermelhavam em cânticos inventivos... Imagens que seduziam seu apaixonante paladar deveriam, em sua resplandecência matinal, entardecer junto aos filhos da névoa de suas sensações... Mas não se viam as folhas que desciam das copas dos ipês amarelos... No final da tarde, os ipês bordos se entrelaçavam em pedrarias mais vivas e menos estridentes aos olhos arômatas... De méleo-aflautados só possuíam os troncos que inspiravam rubores virginais...

No regato rebrilhante de superfície argêntea pelo plenilúnio aprofundavam-se os rubis e as esmeraldas líquidas... Margeado de arbustos de ervas leporinas, murmurava presenças que ali antes deslizavam... Deixaram vestígios férreo-globulares pela extensão abissal que o tempo abriu em sua estreme eclosão...

Percebiam as aves leguminosas, imensos leitos de vegetações umbelíferas; dentre elas algumas flores sabiam resfriar a vermelhidão da epiderme sensitiva das pedras nascidas em ramagens procriadas em matas sérreo-tropicais... As lívidas espumas formadas pelas represas se desfaziam onde o rio distribuía suas raízes em córregos quentes e borbulhantes; todos desaguavam no brejo de um cipoal...

Qual rumo tomou a simplicidade insigne da pintura? Era o que desejavam saber as acácias de meia-tarde... Alvas lúnulas na órbita de um cogumelo que lança poeira de cristal, gemiam oclusas em seus velhos hábitos que já teceram ilustres fímbrias douradas e ardentes...

Constantes floreios ainda se revelam em evaporações rosadas; no alto, o redemoinho da nebulosa, oculta gostos ástreo-atemporais num sistema constelativo cuja ordem de seus lampiões siderais pouco mudou para quem a observa de uma plantação de metamorfoses, mas a única certeza de um cometa real já atravessara o invisível...

IX

Nuvens purpúreas sombreadas em amarelo perolado vagavam num horizonte em degraus; formavam-se sutis camadas de cores do azul imenso ao verde que laranjava tornando-se violeta a coroar o Sol de um vermelho vivaz; logo se delineava um escarlate de fogo à sua circunferência áureo-heliocêntrica... Mais uma vez ele vai embora, baixando a cortina do breu profundo...

A escuridão de um enigma era promissora, algumas plantas fechavam suas folhas quando tateadas por ribombos claros, pequenas vegetações tremulavam suas folhagens nérveo-espasmódicas; o som do néctar cintilante ascendia em lavouras nutritivas... Alastrava-se, pelas filigranas de cipós rumorejantes, trepadeiras roxas que numa serpeação cacheavam-se em lustres víneo-roseantes...

O luar róseo-apoteótico hipnotizava moitas caninas que cantavam lamentos pálidos e bruxuleantes; eles deixavam rastros fosforescentes por todos os locais onde passavam; via-se do alto, estranhas figuras luminosas que eles pincelavam em sua natural e criativa ingenuidade de farejar os sussurros gramíneos...

Belíssimos caramujos cristalinos também alumiavam as extremidades escuras do penhasco estonteante; abeirados nele, algumas espécies córneo-lanígeras dormiam em vigília simbólica, sentiam o vendaval umedecer seus rugidos afônicos; de seus olhares labiais se acomodavam em mais de três... E a noite se desenrola, traz com ela as estrelas que já não mais existem...

X

Águias malváceas maestravam águas pelo jardim de seus sonhos, eram mais que flores galináceas, seriam filhas da percepção que elevam suas condições lenhosas no tocante ao Sol... No fundo, as paisagens píneo-resinosas aspiravam ao verde clamor das plantas rochosas; suas formas eram repetidas pelas núvulas camaleoas que arborizavam o horizonte em tons de rosa e traçados marrons...

Em tardes cinéreas, o calor estrepitoso ainda presente sobre a superfície arenosa, bronzeava a olfação das lobas drupas; tanto podia ser mais longo o tempo, mas em instantes o Sol entreolhava tudo o que dele era extensão; reluziam os castelos céreo-enlourecidos no reino das abelhas, o perfume que arpejava os beijos fulvos vinham dos segredos melíferos, do micro-cosmo de uma colméia de ouro...

Quiseram atravessar os solos êneo-pedregosos as púrpuras serpentes, mas repousavam movendo suas línguas sinestésicas onde se fixavam intenções muito confusas; de súbito um fragor violáceo vogava uma atroz tempestade para alimentar os aguadouros azuis e cristalinos da manhã que renasce...

Era sorrindo que a vida térreo-hidrosférica estava no auge da estação dos perfumes diurnos; como eram belos os limoeiros na beira do precipício, neles também nasciam morangos azulados; um anjo que através dele saciou sua sede de deleites eminentes sonhou com joaninhas multicoloridas sobrevoando um lagarto que produz leite luz-de-rosa, e as poças aumentavam de tamanho, cactos emergiam, abriam suas asas de borboletas, seus ovos transparentes paravam nas margens onde já se alojavam eufóricos e estáticos a procura de aconchegos lâneo-ruminantes...

Por que as meninas sempre surgiam trazendo pássaros frutosos?

Onde nasciam habitava a iluminação râmeo-polinizante... A ternura, o maior tesouro delas; olhar de puro amor, em meio a tantas férteis maravilhas, somente sabores belos e nunca féleo-incolores; se elas pularem para a realidade, o mundo, glacial não mais será...

XI

A cerração cínzeo-reverberante fazia um cinturão em torno do vulcão das calimujares que amalgamavam um serpear de sangue com rubinosos miados e pios salíneos... Com os olhos fechados enxergava os gritos que bem podia degustar... A lebre acomodada em sábias paineiras, a contemplar herbários vérdeo-introspectivos, presenciava a umidade em sua intimidade e tamanho integral; se despia de um frágil despertar uma vida d’água que assim alvorecia...

Pelos arvoredos sombrios um ar núveo-esfumaceado; era o que acontecia quando os cedros ofegantes sonhavam envergando seus corpos lígneo-exalantes... A penumbra silenciosa sempre foi a paz de seus descansos entre pererecas e lagartixas videntes...

Às vezes a Noite fabulava trovões que viravam sombras para uma ressonante lunofobia; somente as pupilas pláteo-auditivas não a temiam, muito menos não a tangiam... Eram mais que florosos fluxos luminosos soando no negrume têxtil... Pois já amanhecia onde a ausência do luar se reduzia a arenosos filetes...

Abria-se uma clara passagem entre as folhas operculadas de um véu éreo-resplandecente; no vento, um odor de ferrugem marítima; do chão, um vapor oleoso e colorido; ambos emitiam zunidos de plantas e nuvens arruivadas... E a claridade estrepitosa invadia as narinas de um bege desapego...

No aguilhão de uma planta rochosa, vestígios de uma rubente argila; derramava-se sobre uma abóbora ofídia que fazia mais de três voltas em torno de uma toca de corujas dicotiledôneas... Alcançava minérios desconhecidos e pedras jáspeo-fragmentadas...

Além de um cercado longínquo, em alguns conúbios pela verde imensidão, a serenidade cápreo-interiorana; brilhavam como manchas leitosas de uma gípseo-saliência num céu de gramados viçosos e refrescantes... Sede da Terra; e o poço de lisos tijolos cobertos pelo limo transbordava sua água azul e límpida...

XII

As mais belas flâmulas seguiam por fendas sensíveis; uma meiga e plúmeo-jardinagem em suas rubras extremidades emitia venéreo perfume de cor amorosa; fora do abrigo de sua outra parte a fabulosa flor conífera cantava o nome de sua morada... Aonde a seiva de sua vida se concentra? Quão era líquida a sua oração de tons láureo-verdejantes... Dourada sob o Sol da primeira manhã... Mas sua força vulcânica estava impressa em estigmas magnéticos...

Em cada irradiação um melisma palatal; por todas as vias porosas um ziziado com laços de virgíneas imaginações... Nunca mais a harmonia fáuneo-original... Há um inefável sentido para seu ímpeto sobrevivente; mesmo em superfícies ternas e frágeis ou em solos táureo-furiosos... Longe das pedreiras eram folhagens de rapina que se aqueciam na vermelhidão derradeira do eterno ocaso...

Febril era o bulício das pedras entre as raízes externas de um arbóreo ancião; nobre enlevo fazia de seu cerne um espírito que compreendia o êxtase afetivo da Natureza... Sua pele no interior da água se apresenta num tom cróceo-sanguíneo; dilui-se na presença de salmões alados que uivam formando bolhas quais não emergem através do dia, tão pouco constantes numa figura geométrica...

A música das gotas na gruta chuvosa amenizava os instintos

úngüeo-afiados das panteras de ferocidade magenta... De notas em pingos se fazia em pontos leves e anilados a beleza que inspirava serenidade a todos os entes do ruidoso olhar... O rio que guardava funduras sáxeo-irregulares, depois, um plano de crisólitas, hoje corre em direção a um valor que voa além de uma terra aurífera...

No fim da tarde que dava luz a uma jovem noite, via-se no amado hálito de uma menina de docilidade luminosa o som de um sentimento somente provado em paisagens de sonhos; lá a sua linda face repousa espelhada em todas as lagoas, pedaços vivos d’água que desejam um dia unirem-se em nome de um semblante maior que projetará loura pureza num céu de ternuras; de lábios que exprimem a forma do beijo; E o Todo é sentido por plantas cardiopétalas...

XIII

No frio pântano onde exala o verde coaxado dos pequenos frutos pulantes, viscosos entes que vieram dos brejais hoje submersos no Passado, mora pelos bambuzais uma estranha movediça; ela outrora se acomodava dentro do caloroso entardecer que, suspenso no Tempo, harmonizava as mais belas cores vocálicas...

Numa clareira sélveo-torrencial a única aglomeração de ventos circulares entre enormes cerejeiras quais ocultavam com seus topes a sidérea claridade do Céu marinho... O ferrão de uma planta rugosa dilatava-se ao fazer gotejar denso líquido cor ameixa; penetrava as maiores pedras que ovulavam por néctares geratrizes...

Onde a areia era rosada cresciam flores ainda apétalas que eram as nativas professoras das meninas de mútua idade... Os seus sorrisos pautavam as carinhosas vozes flutuando entre as róseas lembranças dos palácios de seus corações que se visavam em sonhos...

Eterna se fazia a luz das almas aletófilas quando serviam-se de dádivas fáveo-ensolaradas... Elas usavam o espelho das águas apenas para apresentarem duas percepções de suas belas faces... Quase não desejavam apreciar o que só poderia ser visto pelo lado externo...

A beleza contida no núcleo de algumas existências são magmas sob as mãos escultoras de uma consciência lúmeo-criadora; por vezes essa identidade interna se exterioriza com fidedignidade... Então os colibris da perfeição aparecem para reverenciar a arte originária do inatingível e condutor mistério do Universo...

Para ouvidos que aqui não enxergam, arpejos de cores jamais sentidas na aquarela espiritual soam como errados; por tão diferentes colorem a linguagem flúveo-ondulada que se expande num amarelo violoncelado até atingir perfumâncias sedosas... E a menina da lagoa vermelha deleita-se com bergamotas estelares enquanto é amada por quem lhe atribui magnífico sonho de perguntas e respostas secretas como fossem olhos que se comunicam em gestos lilases...

XIV

O Céu zúleo-enluarado reflete num lago tranqüilo, mais fiel que a própria imagem; sobre ele uma vitória-régia irá eclipsar a projeção da Lua, já que é conduzida em sua direção por uma imperceptível correnteza; o rio que o alimentava de gota a gota era a luz de um tátil murmúrio quando mais movente do outro lado...

Notava-se que os lírios cor de creme apontavam para as duas direções céleo-nubladas; algumas gaivotas briófitas construíam uma morada de conchas que traziam das margens de um denso oceano...

Não se sabia de onde, mas elas sempre estavam presentes com suas graciosas inocências; As Meninas da Alegria que floresciam se não surgiam de algures paradisíaco... Seguravam peras e pêssegos sorridentes... Que felicidade maior elas podiam beijar? Como anjos pela mádreo-natureza secreta...

Onde ela está? Na alma de quem as ilusões do mundo não estão... Sempre com singelos vestidos brancos; visão de quem vive a Pureza, pois elas são nuas como as flores, as árvores, as pedras e as vidas que passeiam, voam e nadam...

Das nuvens, quase paradas, lágrimas crísteo-abrisadas; por tão leves choviam para os lados... Era num outro adormecer da tarde, mas a musa do Sol estava lá no cimo etéreo... Naquele tempo, neste ou não se sabe qual, a magia da Existência fazia amor com quem a sonhava jamais desejando despertar... Com outra face voltada para a Terra, lá ela abria os olhos, numa iluminação ruiva e sutilezas ígneas do lado oeste; o que lembravam sardas eram pontos esmeraldinos...

Luzes inebriantes atravessavam os vapores que se espalhavam pelas alturas; E o Arco-íris sempre foi tão perfeito? Com suas notas musicais bem afloradas... Sob o lúneo-significado a Paz defluia suas certezas e forças para um próximo amor de auroras... Segue entre a primeira estrela e o bom dia dito pela geada serena, a Noite que se expressa em pálpebras sobre as esferas óticas da Vida...

XV

Libélulas jadeadas de asas mélicas faziam amor sobre os favos de um entardecer silencioso; via-se o horizonte em chamas laranjadas quando os exóticos seres alados orbitavam uma imensa borboleta azul cujas asas oceânicas apresentavam símbolos púrpuros;

Magnificências de uma natureza selvática veneravam suas floradas fêmeo-majestosas; seus olhos podiam tatear os cheiros que eram ouvidos por uma melina atenção... E o pólen prateado cobria as campânulas aluadas tão claras e luzentes; lembravam sinos de leite que chovem banhando fadas melíferas...

Ronronados bordos e macios... Paragens plumosas... Sonhos provados por lábios de laparos sábios... Focas brancas de felpuda meiguice assumiam a forma de uma enorme flor de neve... Quando as cascatas falantes respiram um tempo doravante, as figueiras tornam-se árvores de pássaros melissosos; tantos passos para chegar num refúgio cérneo-placental... E as águas dormem...

O tapete de musgo era uma infinidade de sapinhos cujo verde decorria do limão prematuro e alagadiço... Assim ele encontrou a legítima alegria... No capim cidreira sob os pés dos abacateiros...

Liquens também falam e no que dizem há cores somente identificadas através das palmas das mãos de um caminho... Numa engraçada e mágica poética da Natureza... Pintada com seiva fina, esculpida com barro lodoso, escrita com flores ovíparas e riachos vertebrados... Apenas raízes nas profundezas fluviais? A translúcida forma de um segredo azul... Obra dos Sentidos Quintessêntes...

Naqueles momentos, sorriam nas copas das jabuticabeiras, as meninas que beijam as flores com seus bicos de mel, anjinhos que festejam na chuva... Dos pés descalços sobre o que não era terra diferente da grama orvalhada que o Dia espera, mas nem de areia se podia acreditar que era... E o coração do Universo se eleva...

XVI

A Chuva desce esverdeada nessa tarde de hoje vinda do Ontem, mas apenas completa amanhã por um sonho de vitalidades violetas e flautosas purificações... Ele parecia adormecer no Sul quando a Terra olhou para outra esfera fraternal... Mas chovia para a alegria e tenras lembranças de uma vida máreo-velejante...

Via no íntimo das úmidas canções que estavam no ar junto à maresia que lá a aguardava; os ventos levavam as suaves flores de camomila para um jardim de tardes... O Sol, já oculto, brilhava verde no Silêncio; mas somente para as pedras e sombreiros anciões fazia amplo e evidente sentido...

O canto da cigarra corava o perfume do anis... Passava pelas trilhas de areia fina como grãos de água sólida... A menina de luz e cabelos de topázio, pele láctea e olhos da Noite, segurava um casulo; ela procurava um local acolhedor para a continuidade de seu ciclo vital que sem querer um relâmpago assustou...

Marulhos refletidos no Levante; ondas sáleo-espumantes num espiral formavam uma morada que se desfazia em instantes... Não demorou para as meninas aparecerem; a cada concha linda que encontravam: um sorriso para retribuir sua ginélica beleza...

Pelas árvores das montanhas havia enormes balões de vespas dependurados em seus galhos penuginosos; um ruído ocre raspava os paredões pedrosos que pareciam sussurrar... Chorava? Ou apenas dois olhos d’água na grande pedra? O líquido quente descia deixando linhas limosas até o pequeno banhado cujas margens eram pubisadas por rasteiras flores compridas e vermelhas...

Do denso som que o azul escuro recendia ainda era possível localizar alguns fragmentos; o pássaro áleo-libertador trazia sua maior parte de um horizonte desconhecido; mas o azul era mais jovem que o restante devido ao tempo que lá não passou...

Sempre agradecendo ao amor que jamais lhe abandonou, vive a pureza que somente os mais raros sonhos abrigam. Avivam e os conduzem aos momentos que estão eternamente sorrindo...

Giuliano Fratin (2010)

(do livro Um Pedaço do Universo e Outros Trabalhos)

Giuliano Fratin
Enviado por Giuliano Fratin em 17/09/2011
Reeditado em 30/08/2012
Código do texto: T3224183
Classificação de conteúdo: seguro
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