Jesus de Verdade
Ela acordou muito cedo naquele dia,
Com filamentos de luzes matutinas,
Que desbravavam frestas
Do telhado quebrado,
Batendo em seu rosto macerado
Pela rudez da cotidiana realidade.
E mesmo de viver sem vontade,
Serviu-se da água de uma lata,
A lavar sua face por acordar
De pesadelos acres.
Dormiu com fome...
acordou transpassada...
mas reservou quatro pães
para a criançada.
Desfez a cama de papelão,
Varreu a terra do chão de terra,
Reuniu os trocados do trabalho
De ontem.
De catar papelão, guanhara quimera...
E foi comprar trezentos de mortadela
Na venda da esquina da favela.
Tinha esperança que na manhã
Do dia seguinte,
Acha-se boa comida,
Restos das ceias...
Pois das ceias...sei-as...
E ela sabia, e resabiada, saberia...
Que ali encontraria
Nos lixos dos egoísmos em não repartir,
Comíseros...míseros comeres...
Sobras da sovina individualista.
Subto...volta ao estar real...
Apanha seu carrinho de catar papel,
Reune as crianças e sai pra rua
Fazendo trem...trem...trem....”piuíiiii”
Pois marido...esposo...homem...
Amante...não tem,
E só consigo,
Segue...os caminhos sem ternura,
Carinhos que não tem.
Já é noite quando voltam
Com a alma em fiápos...
Silentes e sem vida pelo cansaço,
Adentram o barraco.
Ela improvisa por mesa, quatro caixas
De papelão,
Uma toalha feita de jornal,
E com certesa...uma vela acesa
Pois não tinham eletricidade, nem lampião.
Estava posta a mesa de Natal.e deum pequeno embrulho tira
Os pães murchos e a mortadela.
Enfeitando a mesa, flores baldias
Apanhadas na ruela...
E disse aos filhos:
__Enquanto o sol não vem,
Aproveitemos a luz da vela
A iluminar o casebre de ôco teor,
Pois hoje estamos comemorando
O aniversário de Jesus,
O nosso Salvador.
Nisso à porta alguém bate!
É o menino da maloca vizinha
Com rosto de fome...
Criança tão pequenina...
Ela...maravilhosa mãe...
Faz entrar o menino
E dá para ele...o pão dela...
Meio filaozinho seco, com mortadela.
E ali se fez Natal...
Jesus estava presente,
Num barraco de pobreza.
Sorrisos em carinhas sujas,
Destituidos do dinheiro.
Vítimas da avareza
Mas reis...reis...
Com Jesus Verdadeiro...
Senhores absolutos da mais bela pureza.
E o caçula provoca uma lágrima materna,
Ao dizer olhando nos olhos:
__Feísss Natal, mainha!!
Opus Sewaybricker
Dezembro de 2006