Nau dos desesperados

Sinto em meus ombros

o sustentar da cruz...

Na minha voz,

passos trôpegos,

rumor de correnteza.

Meus olhos, imenso Oceano.

E minha vida,

a nau dos desesperados,

mortos em seu convés.

Os tripulantes mataram-se

uns aos outros e

o único que restou,

fui eu!

Minhas mãos manchadas,

vestes tingidas de vermelho...

Será que devo crer

num sentido para a existência?

Sou o último, sobrevivente,

daquela nau,

onde tantos gritaram de dor...

Deus os fitou...

Mataram-se uns aos outros!

A mim, somente uma saída:

abrir os braços e lançar-me ao mar...

ser mais um!

Vejo seus rostos em agonia

chamar pela morte rápida,

fechar os olhos,

partir!

E eu? ainda vivo....

ouvindo o vento bater

em minhas folhas

e as arrancar...

O vento é o som dos gritos

dos tantos pobres coitados,

que vejo aos escrever

estes versos...

e seu sangue,

clorofila!

O barco começa a afundar...