A partida de um anjo

Um dia qualquer.

Madrugada.

Laptop à mão.

Enfadonhas consultas, inócuos teclares.

Repentino lancinante clamor lacera-me as divagações, arrancando-me da medíocre tarefa.

De enfastiado precipita-se em retumbantes embates torácicos o prematuro arrimo cárdico.

Atabalhoado, perscruto os residenciais recantos em busca do desditoso lamuriante.

Seculares angustiantes segundos...

infindáveis atormentados queixumes decorridos...

deparo-me com a desditosa vítima de sua própria pureza.

Inocente de todo e qualquer pecado, cuja única injúria cometida fora ter neste perverso humano mundo nascido...

Cândida como os querubins, Vaninha, felina, criança inda, menina.

Nem 2 primaveras vivenciais.

Dantes, travessa, alegre, saltitante....

Doravante, arfante, suplicante, agonizante.

Ensopada em sua própria saliva, trago-a ao peito, com a ternura dum anjo ferido.

Olhar fixo ao meu.

Agônicas súplicas.

Por que, meu Deus? O que posso fazer?

Se possível fosse trocarmos de estar!

Alma dilacerada,

incontidas lágrimas,

gotejo-lhe segurança, amorosamente.

Toco-lhe a fronte, afetuosamente.

Voz embargada, canto-lhe canções de sonhar.

Entoo orações conhecidas, desconhecidas, deste e doutros mundos.

Garanto que me sinta.

Não está sozinha... não, não está...

parece que entende... sim... entende... não está sozinha.

Eternos minutos.

Esvai-se, em meus braços, imaculada alminha, a desconhecidas felídeas dimensões.

“quando a indesejável das gentes” chegou, ela não estava sozinha, não, não estava, ela sabia disso.

Se um dia reencarnar, espero, ao menos, ser puro como um gato.

Rafael Lengruber
Enviado por Rafael Lengruber em 09/04/2022
Reeditado em 09/04/2022
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