O ÚLTIMO POEMA
O ÚLTIMO POEMA
Manoel Belarmino
A noite se vai, aprofunda-se,
Fúnebre, arrastando tudo,
E minh'alma ensanguentada
Geme a injusta dor do absurdo.
Rua e tempo cor de sangue
De minh'alma ensanguentada
E em meu sangue interminável
Afogará a madrugada.
Corpo rasgado e alma ferida...
É meu corpo, é minha alma,
Que vai, se arrasta e caminha,
Sem rumo na noite calma.
Gemidos, gritos do silêncio
A noite ensurdecem, rasgam,
Mais que os gemidos do corpo
Quando no sangue deságuam.
Um poema com tinta de sangue
Minh'alma escreve o derradeiro.
É o último poema, o último,
Escrito em sangue em tinteiro.
Um cheiro de sangue fúnebre
De alma rasgada, ferida,
Se espalha pelas ruas frias,
Vazias, na noite sem vida.
Corpo rasgado, matéria
Pútrefa, em pó transformado,
Só alma arqueja, semimorta,
Num ser que se vê finado.