SPECTRUM

"I am tired with my own life and the lives of those after me,

I am dying in my own death and the deaths of those after me."

(T. S. Eliot, in A Song for Simeon)

I

Onde nada ousa a emissão de um ruído, que subversivo soe

À maciça seda dos céus inviolados

Tampouco, irrompe dos solos já gastos por nossos passos

Premeditados e medidos em intrínsecas heranças.

A vida espreguiça-se desesperada por ver-se apequenar

Irremediavelmente, gemendo um rumor de luto

Alheado por seu corte à pungir inclemente:

O ser a si, assim, sente-se: vivo e pouco

Vivo e findo, antes do fim, quando nada lhe acorre.

E o senso maior de viver revela-se, somente

O hábito de se habitar um ambiente habitual.

II

Sem maiores razões, esperamos que se amanheça o crepúsculo

Sob os franjas de treva doente, e decifrar passamos

O enigma de curso sonhado, o sonhado curso

Desatando-se claro dentre os laivos do percurso errante.

Ídolos: não evitá-los, destrui-los. Antes, adora-los

Como se adora à um candelabro a arder em tempos sinistros;

Amar o vislumbre que te ascende o seu lume pioneiro

E desprezar sua figura falha: testa-la à duração sucinta

Confronta-la em ti, transpô-la, supera-la, e por fim dos meios

                                                                      [Destruir-se a si para um recomeço.

III

Bem quisera o afago vital de uma pulsão

Mas debandara há muito das revoltas

Incitadas em histéricas segregações.

Mas que valeria uma voz mais à nausear

Um nojo alheio em seus embargos, se não podes

Atonar o complacente dissabor dos velhos

Que atenuam amargamente na gestação do próprio óbito.

IV

É quando rebenta dos cumes uma flor a exalar-se feito fêmea

No cio da estação, disseminando-se por alamedas

Desertas, preenchendo as lacuna que o homem desabita

Rompendo raízes arraigadas ao tempo que as dissipa

Quando chegado o que suscitara no vazio espaço de um corpo

Medida que o ser exerce no mundo, agora de maneira mais sublime

De ser, estar e pertencer, retido ora intacto, ora desfigurado

Pelo olvido resguardado, és proferido, eventualmente evocado em equívocos.

 

V

                                                                 

As horas escorrem nos relógios e calendários

Mas fincam-se no chão da sala inconvenientes.

Calcam-se das cinzas de seus mortos os homens

E caminham atônita e longamente de encontro ao passado (?).

Não, não caberá indagações ao tempo imaterial e futuro

Posto que és todo mistério idealizado e trágico conseguente

De inconsequentes divagações concretas. Posto que és todo

Um frêmito a anunciar-se para nosso temor impotente

Encarecido de paciência, e renúncia.

Nem cabe-nos evocar as cinzas resultas e pecar no anseio de altera-las

Já originalmente alteradas pela queda do anjo ao mortal: substância

Inalcançável. Foste carne, a nutrir-se, agora dorme eterna

Velando a si mesma, encantada por sua singular dor de Pietà.

 

HenriqueBazzí
Enviado por HenriqueBazzí em 03/02/2018
Reeditado em 19/02/2018
Código do texto: T6244274
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