O QUE DIRÃO OS MORTOS?
Na visita aos mortos
sempre alguém irá recordar
alguma coisa banal.
Lembrarão de coisas tão mortas
que até a própria morte desconhece
e fica sem saber se acredita ou não,
por reconhecer que ali,
na necrópole, nada mais
tem sentido de ser.
Procurarão lágrimas ocultas
que venham a banhar
as meninas dos olhos.
Farão semblantes de tristeza e dor
na tentativa de convencer
aos que se supõem vivos
do quanto aquele morto
lhe era valioso.
Tentarão convencer alguém
de que aquele que ali se encontra
lhe era de grande estima e valor.
Acenderão algumas velas,
farão inúmeras orações
e sobre as funestas lápides
depositarão lindas flores.
Tudo como prova de amor,
de reconhecimento e eternas saudades
de um tempo que jamais voltará.
Assim comporta a humanidade
enquanto caminha para o fim.
O que dirão os mortos
com as visitas dos seus
e de outros desconhecidos?
Certamente discordarão de tudo
que do lado de fora é encenado,
pois, em vida, a coisa era outra,
completamente diferente
da que se faz presente.
Quantas vezes, dirão eles,
esperei por um abraço carinhoso,
por um sorriso alegre com minha volta,
por um apoio sincero que me elevasse,
por um pouco de compreensão
nos momentos em que fraquejei,
por uma palavra amiga
que me fizesse pensar duas ou mais vezes
sobre o que eu deveria ter feito antes,
de tomar qualquer atitude inadequada,
e infelizmente você não pôde me socorrer.
Hoje você vem procurar por mim,
trazendo-me velas, lágrimas e flores?
Por qual motivo você assim procede,
se por tantas vezes busquei luz
em seus olhos, calor em suas mãos,
e você só me disse não?
As velas seriam para alumiar
seus caminhos tortos e obscuros,
para acender seus momentos
de alegria com que eu não pude compartilhar,
pois fui esquecido de ser convidado
por você, entre seus inúmeros amigos.
As orações deveriam ser para pedir
proteção para os habitantes da terra
que não sabem como viver
o simples prazer da vida que grita
dentro de cada um.
Não quero suas lágrimas,
pois bem sabes o quanto seu sorriso a mim
sempre foi valioso e gratificante.
Muito lutei pelo seu sucesso
e tudo fiz para vê-lo feliz.
Hoje nada mais posso fazer,
nada mais posso sentir por você.
E quanto às flores,
estas deveriam ser para alegrar
seus momentos felizes e suas conquistas;
nunca, para serem expostas aos vãos
deste deserto onde descanso,
após ter passado pelo seu mundo
de fantasias e sonhos mortos.
Nova Serrana (MG), 20 de novembro de 201