Não Sou Nada

Peito fraco, não respiro

Pernas bambas, tenho sono

Olhos fechando, a letargia me doma

Me toma

Minha alma está se esvaindo

E o corpo antecipa a decomposição na terra fofa

Ingiro e faço expelir

Engulo e me fazem cuspir

Bebo e então sangro

Amo e então (me) partem

Vivo e então já morri

Frágil como um inseto crescendo entre humanos

Como um humano crescendo entre deuses

Frágil como o último raio de sol engolido pela montanha

Como a montanha engolida pela escuridão

Frágil como um espelho feito facilmente em cacos

Como um pescoço cortado por esse mesmo vidro frágil

Não sou nada, mesmo pedindo insistentemente para ser tudo

Mesmo implorando de joelhos para ser qualquer coisa

Não sou nada, sou outro rabisco qualquer que pode ou não virar poesia

Que pode ou não ser lido

Que pode ou não ser compreendido

(E que ainda assim pode ser que venham a criticar)

Não sou nada, não peço mais para ser nada

Se em meus ossos moribundos o limite já atingi

Teus olhos me alcançam com pena

Mas os meus te atravessam

Tuas mãos tentam erguer meu corpo

Mas estou apaixonada pela inércia

Sou lobo solitário e vim aqui para morrer

Não precisas desta cena em tua memória

Não sou nada, afirmar diverso é ilusão

Se hoje eu virar poeira

Amanhã o Universo continua a girar sem mim

Não sou nada, o orgulho é só outro dos venenos que me mata devagar

Se eu escolher luz ou escolher trevas

O mundo não vai mudar um tom de cor sequer

A lágrima que cai do meu olho não afoga um inseto nem rega uma flor

E ninguém vai perder nada se eu decidir viver sem amor

Não sou nada, não me peça para ser nada

Eu amava meu brilho mas ele me enganou

Não sou nada, minhas reflexões cíclicas não farão falta

Estou indo para bem longe virar estrela

E se gostavas de mim, deixa-me ir em paz