PRATA

Não são de cunho austral as reminiscências

que me vêm à mente nestes tempos

quando se ouve, dos ventos mais calmos do rio, o mar.

Então devagarzinho aquele grande tecido dança

como ciranda nunca tida de que se lembre se em criança

e o cochicho quase seco de tanta água nos carrega a nós.

Assim bem dentro de mim mesmo me sinto solidário

a fazer o que todos fazem a tentarem enxergar

o que de si se encontra refletido em tanta beleza.

Os espelhos já um dia foram argênteos

hoje as pratas não refletem mas transparecem.

O sólido é o que se esfumaça e todos os sentimentos o são.

O mar que em muito me lembra o céu

donde as luzernas se oferecem às águas

como tributárias, candelabros dissolvidos em sublime.

Argentada é a argúcia dos objetos etéreos

que não são senão abstração do que há de válido

e mais válida é a abstração que não parece querer valer.

Há, sobre as nuvens, lugar donde se vê tudo mais.

Dali partem de navios nórdicos guarnecidos de gárgulas

a naus em nuvem, tecidas em material mais leve que o éter.

Ali, mirante de tudo que se evola e inspira,

aportam-se também sonhos que de quando em vez passam

nas horas em que estão a um passo das nuvens; em ante-céu.

Sempiterno, repousa o mirante no cimo, capitólio do mundo.

Em arco ogivais, de duas partes, consubstanciam-se

o inédito e o prazeroso, o leve e o inexistir, tu e tudo...

Por eles, luzes que em raios rematam estigmas efêmeros,

como a se poder somente apreendê-los em curta sorte!

Um vislumbre é sempre luz e toda luz é forte.