CONSULTA PSIQUIÁTRICA
Quebrando o silêncio naquele instante,
O aviso da campainha agora soa;
Ergo a vista e avisto adiante
O carrasco de almas, em pessoa.
“A próxima é você – é a sua vez !”
Declama, a voz da secretária.
Teu vulto se ergue em gesto cortês
E volta-se à atividade sedentária.
Na conformidade de alvo uniforme
E dispondo-me da tua aquiescência,
Apresento meu rosto disforme
E analiso depois, a conseqüência.
Sou eu quem melindrosamente se equilibra
No fio limitante da loucura.
Um fervilhão de palavras, agora vibra
Na mente, novamente à tua procura.
Estende-me a mão trêmula e alva,
Recebe-me com sorrisos e sofismas,
Protegida pela cabeça meio calva,
Está a natureza sacerdotal das cismas;
Que herdou de Salomão, o sacerdócio,
A luz dessecante da subjetiva ciência;
Sob a luz dissertiva de outro sócio,
Analisa o negrume vil da inconsciência.
“Como tem passado os dias, minha amiga ?”
Os dias não passam, sou eu quem passa por eles !
Dita-me orientações para que eu siga;
Cita-me remédios, que preciso deles !
Atrofia-me as paredes desta sala,
No recinto doente em que me vejo
E nervosamente o dedo estala,
Ao mesmo tempo em que latejo.
Sob a forma branda de um ósculo,
Receita-me o remédio complicado;
Conserva-me tal qual fiel apóstolo;
Certifica-me sobre o que foi aplicado.
Tento desvendar novos enigmas
Sobre gestos e sentimentos platônicos
E me perco em certos estigmas
Em que se perdem, seres antagônicos.
“Até a próxima vez !” Ouço a voz lacônica
E me ergo e me arrasto até à porta;
Com a idéia cada vez mais atônica,
Traduzo desta vez o que me importa.
Retrato um selo em teu rosto,
Embriago-me com gosto de vitória
E sigo rumo ao lado oposto ...
Sustentando estátuas de glória !
OBS: Poesia publicada no livro "Arte de Viver" (Coletânea Nacional de Poesias) por incentivo do nobre amigo Dr. SALOMÃO RODRIGUES FILHO.