LÍNGUA
Sou a língua ferida,
navalha afiada em murmúrios velados,
que corta o silêncio,
mas também cura,
no toque macio de palavras pensadas.
Sou a língua felina,
que desliza ágil entre dentes cerrados,
despertando verdades ocultas
ou venenos guardados.
Cabe no céu da boca,
mas se lança ao infinito,
cósmica viajante
nos labirintos do dito e do não dito.
Sou a língua poliglota,
que sussurra, grita, cala,
traduz o mistério do ser
em preces ou fábulas.
Amargo, doce,
saliva que carrega a vida,
ora fel, ora mel,
prova o mundo em cada despedida.
Sou a língua que fere
quando o orgulho é espada,
mas que exalta,
quando o amor se faz morada.
Lambo feridas,
saboreio histórias,
guardo em meu sabor
a memória de mil glórias.
Entre palavras e silêncios,
sou ponte ou abismo,
sou sentença ou abrigo,
sou a língua
dom e castigo?
Tião Neiva