O ÚLTIMO SUSPIRO
Apelidaram-me de vida,
Mas aquilo que chamam de vida, não teria que ser abundante e bondosa?
Não era seu papel mostrar-se voluptuosa com suas cores de arco íris?
Contaram-me mentiras, e eu em minha própria composição errei a letra, errei a nota, desafinei, e toda minha orquestra errou comigo.
Errei tudo quanto tinha pra errar, porque a vida de nada se distancia da morte.
Não há luz sem sombra, nem bem sem o mal, nem choro sem o riso.
Se em tudo há em si mesmo seu ponto de contradição, porventura morrendo voltarei a viver?
Chorando voltarei a sorrir?
Odiando voltarei a amar?
Pairando sobre a relva daninha, voltarei a correr?
Percorro léguas a fio e meus pés sangrando, meu ar rarefeito, meu peito diminuto, para na beira do rio, admirando o trágico, na tentativa de desafiar o grito agonizante da esperança, para ao menos, no último suspiro, acreditar que a vida sendo a morte, a morte também poderá ser a vida.
Meus passos controversos, minhas pernas estremecidas cambaleiam entre si, eis que já não consigo seguir em linha reta, minha alma, que um dia encontrou a nirvana, agora encontra o repouso dos dias enfadonhos onde contaram-me a história mal contada, do barro que gerou a vida,
do ar que não era o sopro, mas o último suspiro.
E um dia, quando mais tarde me procurar a voz aveludada da esperança, mostrar - lhe -ei em minha face, através do espelho da minha alma, não a dor, não o fim, mas as cicatrizes encravadas, que em noites frias, em noites nostálgicas se abrem e consomem suas próprias dores numa tentativa um tanto insana de na própria morte,
voltar a viver.
Patrícia Leite