O Demente
Numa parede gravemente esburacada
Diversas fotos retratando a juventude;
Ornam a sala de mobília empoeirada
Com a distinta expressão da solitude!
Toda beleza e alegria escancaradas
Na galeria das imagens exultantes
São as saudades docemente organizadas
Por uma alma e seus mórbidos rompantes!
São os pertences de alguém envergonhado
E que há tempos no espelho não se mira
Que só consegue conviver com o passado
Que tudo mais a mão do Tempo destruíra!
Também pudera; destas fotos o modelo
É hoje um vaso de ruína envelhecido
Com poucos dentes, sem farripas de cabelo
Que vive às custas abissais de um tempo ido!
Ele está louco! Mergulhado na Sandice!
E sua alma à demência condenada
Vive ao Sonho adstrita e atrelada
Chorando o peso incomportável da velhice!
Não é a síndrome, chamada Peter Pan
O que lhe fere! É outra espécie de loucura
Que nunca foi analisada num divã
Porque só vive à atra sombra da clausura!
Ah nem no rol das mais estranhas Fantasias
Existe um nome para isto que lhe afeta
E não há entre as sensações mais Doentias
Enfermidade horrivelmente tão seleta!
É um sentimento por demais misterioso
Da alma humana, é o caos, é a proeza,
É a revolta contra a triste Natureza
Não aceitar a mão do Tempo Impiedoso!
Por uma fresta, esta alma que se asila
Repara a pressa da humana agitação;
E seu olhar qual uma treva que cintila
Com as imagens incrementa a solidão!
Mas o pior ,o mais horrível e macabro
É que esse homem veramente perturbado
Tem um desejo, ou quiçá, um descalabro
Que paciente, há muito tem elucubrado !
Ele pretende atrair e aprisionar
Um corpo jovem que viceja e excele
Pra cruelmente arrancar a sua pele
E então vesti-la pra assim se renovar!