Mente de um poeta cansado

( I )

1. Estou fadado de não saber o que digo

2. Numa infinita busca pelo original,

3. Num caos, batalha do eu comigo

4. Temo e rezo para não ser fatal.

5. Como hipocrisia é cada palavra que professo,

6. Contradizendo-se com as subsequentes.

7. Pior que estar parado, somente um regresso.

8. Então, ó Palavras, por quê para si mentes?

9. Ademais, se não tenho, no discurso, a lealdade,

10. Só me resta conquistar o original,

11. Mais buscar o original é erroneidade

12. Em um mundo em que inspirado nem sempre é mortal.

13. Em meio ao caos, enquanto escrevo este poema,

14. Me pergunto: "Em minha vida teria eu um supremo lema?".

15. Quando respondo-me que não, entendo o motivo da guerra.

16. A minha mente não está apoiada, como raiz, na terra.

( II )

17. Novamente escrevo e rezo em versos estando,

18. Estando farto de sentir apenas o superficial,

19. Superficial finito e intenso como breve brando.

20. Enxergando no superficial apenas um grau.

21. Em cortinas, apenas janelas,

22. Em florestas, apenas árvores,

23. Em flores, apenas as pétalas,

24. Em águas, apenas os mares

25. Talvez, deva-se à ausência de metafísica,

26. Como Alberto Caeiro, nela pouco me importo.

27. E por pouco importar-me com tal mística,

28. Pensamentos atracam, como navio no porto.

29. Em som, apenas o ruído,

30. Em céu, apenas as nuvens,

31. Em leões, apenas rugido,

32. Em ferrovias, apenas trens.

33. Se Ele há, peço-O que mude esse meu olhar,

34. Meu falar, meu sentir e até o meu ouvir,

35. Para que um dia não morra sem ir para o lar,

36. Ou ao menos sem crer no que de lá ouvi.

( III )

37. A toda hora me falta criatividade,

38. Escrevo versos em pleno desdém,

39. Em meus textos não há sanidade

40. E pensamentos a mim não detêm.

41. Caço ideias em todos os lugares,

42. Mas apenas vejo quadrados e só,

43. Só em preto e branco, aos pares.

44. Como as curtas fileiras, sem nó.

45. Minhas ideias? Sinto estranheza.

46. Meros pensamentos hipócritas.

47. Tamanha é, que é difícil ver beleza.

48. No fim, não passam de falatórias.

49. Nos meus versos, há hipocrisia.

50. Criatividade ausente e criativa

51. Gera-me uma estranha sinestesia.

52. E desdém com paixão que motiva.

53. Arco-íris que não limita-se à gota,

54. Assim são os meus pensamentos.

55. Minh'alma presa, que age como solta,

56. Suplicará por socorro aos tormentos.