CÓRREGO

Vês ali defronte

a ribeira?

É a minha alma

levada por Caronte,

é minha caveira

recém afogada,

ribanceira abaixo

arrebentada,

ainda com o cabo

no pescoço,

com a pedra

no osso,

desfazendo dedos

na terra,

deslizando à cova

em tanta lama,

sepultureiro

da própria carcaça

que se engana

e todo dia refaz

a caminhada,

braçada por braçada

se afogando,

resgatada na rabeta

de Caronte,

desovada sem a paga

na ribeira,

vendo as luzes defronte,

ouvindo a gargalhada

do barranco,

cavando com a caveira

o sepulcro onde escarra

o coveiro

e se enterra por inteira

minha alma

tola, tosca e presa.

Se vê-la

agarrar os remos,

parta-lhe a caveira

ao fundo!

Diego Duarte
Enviado por Diego Duarte em 04/08/2022
Código do texto: T7574890
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