MURMÚRIO
Chove lá fora
Água cai sem avisar
Lágrimas saem desses olhos
A tormenta é um medo a se enfrentar
Já as lágrimas sao um peso da cangaia
Chove aqui dentro de mim
Tempestuoso
A alma chicoteada por relâmpagos
Que não dissipam o negrume da alma nubla
Anuvia
Enevoa
Obscurece o céu que era azul e agora está cinza
Monotonia
Teu olhar me enfastia
Me desentoa
Quando vou me recompor em arco-íris??
As cores que vejo não são as cores que me pinto
Essa metástase alastra e escurece cada canto da casa
Não há luz nem facho que implorando devassa
Avassala e implora a solidão em taças
Brindamos ao tempo em que o brilho se fazia olhar!
Sejamos imprudentes ao menos uma vez na vida!
Nem que essa vez seja a duração de uma pedra de gelo
que derrete e se esvazia de si como meu coração...
Tim-tim!
Brindamos então a fascinação do estado enfático
Onde lente de astrolábio já não vê mais nenhuma estrela em passo
Só eclipses e lunáticos
Louco!
Essa noite desencarnas
Torna-te preparado para quem serás
Ou só percebes que atingiu o próximo patamar ao procurar a carne e encontrar só névoa?
Pergunto
Neblina e nevoeiro são irmãs?
E nós, aparentados, amancebados e emparelhados feito tijolos em parede nua?
A verdade nunca pesa
Flutua
Nua eu te vejo
Mas não sem roupa
Desnuda
Despida
De carne revestida
Vejo te de espírito revelado
Uma opala encrustada no cascalho da estrada
Murmúrio tenebroso a quem chamam de vida
Desvalida e inútil
Nao sejas estúpido
A mão que balança o berço é a mesma que recusa a sepultura
Não...
Dessa vida saí vivo
Dessa morte empobreço
Faz tempo que não mereço outra vida desvalida
Nem em prece nem em crida
e cada frase que ofereço
é um pedaço de mim que vai ao frasco
Curtido e embalsamado
Arrefecido e imortal
Desse mel que te ofereço
Bebe o cálice e te sacia
Bebe o vinho e te alivia
A sede contamina
entorpece
vicia
Come o prato e te alimentas
de pedaço em pedaço
diluído nesse frasco
engole o fel e te sustentas com as palavras.
20/12/2022
15:59hrs