MUTAÇÃO AMOROSA

Quando nos conhecemos tudo se moveu.

Os telhados, os postes e as janelas giraram.

O calçamento das ruas

traçou o nosso caminho.

As luminárias noturnas

orbitaram luas

sobre nossos abraços.

e o vento soprou em um pequeno palmeiral,

para soltar o doce de seus frutos.

Mas quando nos unimos,

o vírus da mosca tsé – tse ou a pólio bucal,

nova varíola, a da pústula do amor,

entrou em nossos corpos,

e nesse dia tudo cessou.

O barro desceu os telhados,

sumiu o mapa das calçadas.

E o vírus correu,

dentro dos edifícios, nos gatos.

Dos bueiros

ao mendigo deitado,

o micróbio ali chegou

e ainda estava dentro de nós,

seus primeiros receptáculos,

as suas flores.

O vírus espalha-se ainda hoje

e - suspeito - carregamos a mutação.

É um enigma de asas,

também é uma dúvida de quatro patas, meu amor.

E o meu coração que o acompanha,

rasteja pelos becos sem anticorpos,

deixa um rastro de humor viscoso,

e tenta fugir de ti.

DO LIVRO: "BORBOLETAS NOTURNAS NÃO EXISTEM"

Paulo Fontenelle de Araujo
Enviado por Paulo Fontenelle de Araujo em 14/05/2018
Código do texto: T6335843
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