CÂNTICO NOTURNO (Republicando)
(Sócrates Di ima)
Aberta se faz a carne,
Numa incisão profunda na alma,
As lembranças invadem a mente,
e a alma pasma,
quente,
latente,
irreverente...
Há nos olhos marejos de saudade.
Canta a manhã os versos da sabedoria,
Á tarde começa no serenar profundo,
As dores latejam no âmago sofrivel,
Sem que se ouçam os quérulos do mundo,
E as canções silenciam o espirito em êxtase.
Esbraveja o "Eu" transeunte de mim.
- Olham-me alguns nas calçadas da vida,
E nos lamentos mórbidos as palavras se perdem,
Há nas esquinas os farrapos humanos,
Deitados na grama que cobre a terra fertil,
E nos chafaris os banhos da pele suja,
Nas cicatrizes da vida sem remendo ás vestes.
- Gritam minhas vontades
na escuridão das minhas forças,
Lamento triste nas mãos das crianças rebeldes,
Nas ruas sujas das periferias,
E nas praças centrais das metrópolis cegas.
- Ide ali nos becos dos desgraçados,
E olhais os amontoados humanos,
Que sem rumo, sem pátria, sem coragem, sem vida,
Perdidas na violência das drogas e da morte,
Gruindos dos desesperados nos pulsos cortados,
Na sangria da alma (vida)que náo tem mais valor.
A miséria toma conta da vida em farrapos,
jogados ao léu, a vida rasteja,
E longe dali, nos palácios da guarda,
O bastão dos reis impóem suas loucuras,
Roubam e furtam, os homens que manteriam as vidas,
E o homem perdido, sem voz, analfabeto de sonhos,
Não tem força para levantar-se e seguir adiante.
- Ah! que chega a noite e o desespero grita,
As carnes frias dos humanos semimortos,
Transitam a ermo, sem a licitude da vontade,
E na escuridão de suas almas, acompanham os reis,
E roubam, furtam, matam em nome da miséria torpe.
Quero arrancar do peito a vontade,
Mas o meu grito ensurdecido,
Mudo, ensandecido,
Não vai além do meu sussurro,
E morro na angustia de ver a vida tão inválida,
Se perder nos braços da ganância humana,
E nas curvas negras da vida.
Ah! que o meu cântico noturno ecoa nas pedras da insensatez,
E ao ouvirem minhas lamúrias fecham portas e janelas,
Apagam-se as luzes e escondem o cristo,
Em joelhos rezam a proteção,
E esquecem de que o pão,
Cessaria o grito dos famintos,
E a água mataria a sede que a vida pede para viver.
E eu choro...
Choro o triste cântico do silêncio,
Que esbraveja na vontade de mudar,
Mas o silêncio emudece na escuridão das almas,
E o meu cântico noturno se perde na vastidão
Da ignorância humana,
Que nem tem vontade de sair á janela e gritar.