BLASFÊMIA
Ó Deus, grande senhor da criação,
Supremo dono e pai de tudo,
Por que deixaste, contudo,
Um de seus filhos nessa solidão?
Não vês, por acaso, que esse ser perece?
Entre tantos cais, tantos faróis...
Naufragou-se nesse mar atroz
Que não se acalma à sua prece.
No deserto, com sede e fome ele está,
Fende a rocha e água não lhe sai,
Vê aos poucos a vida que se esvai
E tu não lhe mandas do céu o maná.
Com fé ele sonha com a terra prometida,
Mas, o Jordão não se abre à sua frente,
Gritos e relinches perturbam sua mente
(É, à sua cola, uma tropa enfurecida...).
Ó senhor, mil vezes a escravidão no Egito...!
Lá ao menos ele tinha o que comer...
E aqui, certamente vai morrer:
Sujo, só, infeliz, aflito...