Infância Arrancada

Os cânticos de amor não me comovem

E já faz algum tempo

Desisti da infância sonhadora antes da hora

Porque descobri cedo demais como perder a inocência

E revelei sem querer que a doçura era óbvia ilusão

Acho que não foi por escolha

Aos doze anos nem em mim mesma mandava

Estava apenas (sobre)vivendo

E abraçando meus bichinhos de pelúcia

Porque estava tudo bem em amá-los

Porque não pediriam nada em troca dos abraços que tanto precisava

Aprendi cedo demais que lágrimas só chamam a atenção por um certo tempo

Melhor colocar um sorriso de mármore no rosto e seguir em frente

Todo mundo te subestima quando tens doze anos

Mas no fundo da minha mente supercrescida eu já sabia

Que quem conhece tão profundamente as máscaras

Nunca vai acreditar em amor verdadeiro

Que quem viu a água transformar-se em sangue

Nunca mais beberá tranquilamente qualquer líquido

Acho que não foi por escolha

Os fantasmas e as despedidas já estavam lá

E só o que pude fazer foi acenar adeus com minha mãozinha magrela

Enquanto aprendia do pior jeito que nenhum deles ia voltar

Não foi por mal, que convidei a rainha do gelo sociopata para tomar conta das coisas

Aprendi cedo que não machuca dizer adeus a quem nunca importou

E que quem importa sempre dá um jeito de ir embora também

Todos culpam a rebeldia quando tens doze anos

E eu queria mesmo que fosse tão simples

Se eu fugisse dos abraços apenas para chamar atenção

Talvez hoje não mais precisasse amar bichinhos de pelúcia

Talvez hoje ainda visse diferença entre beber água e sangue

Talvez hoje não fizesse sentido rimar tudo com despedida

Mas o demônio foi acordado cedo demais

E se há algum cântico que me comove, ninguém o sabe cantar