O SURTO

Às vezes sou forte, muito forte.

A vida se agiganta diante dos meus olhos,

Os pequeninos gestos significam tudo.

Tudo é motivo para uma vida imensa.

Os rumores nas ruas: são festas constantes,

As dificuldades, se surgem:

São lições, são aprendizados,

O assovio dos pássaros ganha meus ouvidos.

As flores do campo acariciam minhas retinas,

As estrelas, no límpido céu, persuadem-me,

Às cadentes não faço pedidos nessas horas,

Agradeço-as, pois sou todo gratidão.

Porém há outros... Outros momentos, e estes são bem longos.

Chegam sem me avisar. Parecem infindos.

Atrocidades... Desfaleço-me.

E os vigores debandam todos.

Agora, os braços inertes rejeitam as ordens encefálicas.

Os olhos fixos, no longínquo, só enxergam o silêncio,

Um vazio cheio que se transborda por dentro.

Meus olhos fixos nalgum ponto longínquo.

Veem imagens mórbidas, um ambiente paralítico.

Um raio d’esperança assoma, às vezes.

Nessa curta epifania, faço planos de uma vida grande.

Mas os fulgores futuros fogem... fogem...

Fogem céleres e esmaecem ao longe,

E o coração se abate muitíssimo.

O medo. Oh! O medo é constante.

Sarcástico monstro de um riso abundante

Um feroz... Magno, maligno, monstro.

Pânico das noites sombrias e silentes.

Ele sempre está aqui perto

Terrível e forte, muito forte.

Às vezes sou também forte.

E destruo esse monstro. Mas ele não morre

Eu o destruo um pouco. Depois da convalescença

Ele se torna mais forte.

Mais forte que uma reunião de boas notícias.

Minhas trêmulas mãos são uns membros à parte.

Desconheço-as, não me pertencem.

O pensamento vagueia por paragens sórdidas,

O que vejo são cenas, são paisagens horrendas.

Hades, Caronte, vale da sombra da morte.

O meu corpo: eu o desconheço

E todo o eu, eu o desconheço, perco-me.

Nesse estado inerme o desequilíbrio se agiganta,

A ânsia afoga-me, sufoca-me nesse purgatório.

Fujo, escondo, procuro-me dentro de mim,

Retorno.

E encontro vestígios, rastros de um tufão.

Ouço o choro de uma criança abandonada

Os gemidos sôfregos e pungentes,

E um moribundo a meditar profundamente.

Abatido por horas, repouso exaurido.

Lânguido, recomponho-me da violenta catástrofe.

Reergo-me do chão purulento e fétido.

Depois da convalescença sinto-me também forte.

A escuridão esmaece, chamo-me, dou-me a mão.

O sol se mostra, encontro-me, vejo-me, sinto-me.

Os pássaros festejam no céu anil.

E a vigorosa vida corre em tudo outra vez.

Daniel Pereira S
Enviado por Daniel Pereira S em 10/01/2016
Código do texto: T5506130
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