Derradeira

Há poesias demais
nesse quarto
de paredes brancas e
labirintos explícitos.

Há o ranger da porta
a anunciar ausências.
Há o telhado acolhendo
o frio calidamente...
E, deixando minha cabeça
sem teto.

Há lirismo demais nessas linhas
traçadas ao acaso.
E por afeto estragado.
Há dor.
Sólida e mórbida.
E, depois,
finalmente.
Há somente a morte.

A última palavra.
O último grito.
A última sombra de vida.
A soprar para fora da existência.
Para fora do arco da promessa.

Depois vem o enterro.
As exéquias, enfim.
O ritual de vestir o
defunto e entroná-lo
na morada eterna.

Tantos sentimentos
passageiros
E essa definitiva morte a
murmurar
eternidades absurdas.

Onde todas as crenças
mais se parecem com
lendas.

Há poesias demais
para o dia de hoje.
Não posso contê-las.
Não posso explicá-las.

Estão em língua morta.
Em peito sepultado.
Num latifúndio imaginário.
Repleto de sonhos e
cores indizíveis.

Há poesias demais.
E minha nudez mental
sente frio diante
tanta morte aguardada.

E que não nos
surpreendemos.
Perdemos a arte
de nos surpreender...

E nesse imenso script
conhecido.
Quero banir a palavra
hoje..
Fico assim entre o
ontem e o futuro...
Num looping louco.

Um me traz lembranças incertas.
Já o outro, me recorda
a certeza da morte.

Até na morte há poesia
em excesso.
Enxuguemo-nos.
Temos que guardar a
alma completamente seca
para a rima derradeira.
GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 18/05/2014
Reeditado em 18/05/2014
Código do texto: T4811253
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