A dependência
Talvez um corte suave para deixar escorrer
e ter tempo de estancar
Alguns frascos de comprimidos para ajudar a dormir
e navegar por sonhos e deliciosos pesadelos
Uma discussão na hora do jantar ou se afundar no sofá para deixar o dia passar
Um devaneio embriagado que permita sorrirmos um pouco
Algumas gramas de entusiasmo liquefeito
um cachimbo, uma ponta, um murmuro do fundo da alma
Talvez um pouco de realidade transviada, transformada, transfigurada?
Um sermão exarcerbado, um rito, uma toga apodrecida
mofada
Que tal um pouco de medo do escuro ou a euforia do desconhecido?
Esqueça tudo numa tragada passageira
num desmaio epiléptico
Nessa demagogia patética
Nas minhas mentiras traiçoeiras e rastejantes
Naquela maldita árvore, no limbo de nossas escolhas e fobias
Um pouco de paz para deslizar até sua cama
Lhe amaldiçoar ameaças e nos sentirmos vivos
Em mais um dia que a morte se aproxima,
Buscamos ao menos um consolo rentável
A poesia enfurecida.