MADALENA ARREPENDIDA
Maria Madalena arrependida
Dava voltas e voltas no seu leito
Porque não conseguia pegar sono
Naquela manhã trágica e fatal.
Os galos já cantavam no quintal
E a aurora clareava no horizonte
Apelando à memória o reviver
Dos momentos da Ceia cruciais:
Nas mesas não faltara mesmo nada,
As contas foram feitas direitinho,
Todos ficaram muito satisfeitos
Apenas algo certo não batia.
Judas saíra muito transtornado,
Por estranhas palavras que ouvira,
Ninguém sabia da mãe de Jesus,
Do Mestre e dos varões nem sequer rasto.
Só ela, ali, na alta madrugada,
A transbordar de medos e suspeitas
Dando voltas e voltas no seu leito
Mas o ansiado sono foi-se embora…
Bateram com estrondo à sua porta
E uma voz conhecida lhe gritou:
- Maria, ó Maria, vem depressa,
Que o Mestre foi levado pelos loucos!
- Que dizeis, ó meu Deus, eu pressentia
Que alguma coisa ia acontecer…
Ai de nós, ai de mim, porque não fui
Com meu doce Rabi até ao fim?
Outras vozes se ouviam pela rua
E até os cães ladravam pressurosos
E já piavam as nocturnas aves
Anunciando presságios e angústias.
Chegaram novas vis e escabrosas:
Que soldadesca bêbada levara
Jesus de Nazaré acorrentado
E a turba no Pretório se ajuntou.
- Rabi, ó meu Rabi, que te fizeram,
Esses Sandeus de mentes infernais?
Que hei-de fazer agora que não estás
Comigo neste transe e nesta hora?
- Rabi, ó meu Rabi, os meus cabelos
Quero que mos arranquem, pois não fui
Capaz de te seguir na escura noite.
Onde estás, ó Rabi, quero encontrar-te!
Frassino Machado
In VIA CRUCIS