OS OLHOS DA MORTE!
Vi os olhos sinistros das criaturas
No desterro das trevas assombrosas,
Em noite fria, senil, das mais escuras,
Transfigurada em sombras tenebrosas!
Olhos lutuosos, formidandos, caóticos,
Tetros, terríveis, estarrecedores,
Olhos vis, despoéticos, despóticos,
Impiedosos, ameaçadores!
E estes olhos macabros, desconformes,
Seguiam-me pelo além das meias-noites
Tão vermelhos, sangüíneos e enormes,
Severos e cruéis feito açoites!
Vi-os surgir das mais negras catacumbas,
Cada vez maiores, ávidos, famintos,
Feito a boca voraz das torvas tumbas,
E assim macabros é que eu os vejo e sinto-os!
Vi-os, mesmo obscuros, à certa distância,
E era um horrendo abismo de esqueletos
O que eu via em minha extrema agonia e ânsia,
Nestes olhos de horrentes globos pretos!
Senti na pele um arrepio tremendo,
Que me percorreu espinha e cabelos,
E enquanto o arrepio a pele ia percorrendo,
Rangiam-me os dentes, tremiam meus joelhos!
Nunca imaginei ver olhos tão estranhos,
Antes os vissem cegos, dormentes!...
Causam-me convulsões e ascos tamanhos,
E vertigens sangrentas de doentes!
São olhos vampiros, gêmeos encruecidos,
Corrompendo a brancura das paisagens,
São olhos graves, hostis, ensandecidos
A vagar por fantásticas paragens!
São esferas vácuas, abissais, mórbidas,
Faz-me empalidecer os lábios trêmulos,
Quando inexoravelmente sórdidas,
Fixam-me como se fôssemos êmulos!
Não me atrevo a encará-los mais uma vez,
Atormentam-me a incrédula alma pasma,
Não há resquício algum de lucidez
No constante olhar débil de um fantasma!
Oh! Olhos horríveis! causam-me o óbvio horror,
Quanto mais se espalha a noite imensa,
Causam-me desespero, aflição e dor
E uma apreensão tempestuosa e densa!
Causa-me agonia e angústia o olhar funesto,
Amedronta-me a estranha órbita exposta,
Sinto que eu mesmo, eu mesmo a mim me infesto,
Pelo medo que em mim logo se encosta!
Sinto a Morte tão próxima e ainda viva,
Desfigurada em máscaras bizarras,
Por trás das quais os olhos à deriva,
Assemelham-se à aspérrimas amarras!
Ah! fosse um pesadelo a se acabar
Com o findar noturno das luas-cheias,
E estes olhos não viessem me assombrar
Ou congelar o sangue em minhas veias!
Ah! fosse apenas um sonho infausto
Causado por um sátiro farsante,
A atormentar-me o espírito exausto,
Com zombaria sarcástica, infamante!
Oh! pudesse fugir da cruel presença
Destes espectros tétricos, dantescos,
Se em mim houvesse ao menos alguma crença
Além de Inferno e Céus funambulescos!
Mas sinto-me inútil, fraco e inerme,
O alvo dos pesadelos de olhos torvos,
A rastejar em covas como um verme,
Sob o agourento crocitar dos corvos!
Sinto uma convulsão doentia, tremenda,
Cai o meu corpo, desaba como um forte,
Sobre os meus olhos é posta uma venda,
E agora eles também são olhos da Morte!