SONHOS DE ASSOMBROS

Sonhos doentios invadem-me à noite,

Sinto um frio convulsivo e doloroso,

Resulta a dor da punição do Açoite,

E vou a esmo, um sonâmb'lo canceroso.

Tenho um sono agitado, tremo exangue,

Carrego sobre os ombros os escombros

Dos meus ossos esquálidos, em sangue,

Pelo Vale infernal dos assombros!

Estou morto no ventre de um Fantasma,

A vagar pelo pântano das dores,

Quase a roomper a bolsa de ar e plasma,

Em estranhos e fétidos odores...

Vago por estranhíssimas planícies,

Um triste Sonhador de extintas eras,

Enquanto esvaí-se pelas superfícies,

A sutil sub-fragrância das quimeras!

Me encontro em uma Esfera enregelada,

Uma esfera homogênea ao espaço obscuro,

Enquanto minha alma é abandonada

No extremo centro deste Sonho impuro!

Arrasta-se aos meus pés cicatrizados

Um tapete de sangue, subterrâneo,

Das cinzas de ossos vis, fossilizados

Ouço o eco oco e ermo e acústico de um crânio!

À minha frente, escada gigantesca,

Suspensa por cipós densos, vermelhos,

Desce a uma profundeza cruel, dantesca,

Como a testa enrugada dos mais velhos!

Em sangue e tropeçando em tristes almas,

Desço os degraus, conduzem ao Abismo,

Sofro e admiro-me assim das faces calmas:

Comiseração do sonho em que cismo!

Tropeço em pontas de pedras de fogo,

Caio no vazio das sombras curvilíneas,

E nestas mesmas sombras eu me afogo,

Sombras frias, nuas, noctívagas, sangüíneas!

Almas de subterrâneas noites fúnebres,

Rastejam em cavernas tenebrosas,

Onde as caveiras de coveiros lúgubres

Observam-me em silêncio, ansiosas!...

Vem ao meu encontro bela e loura Dama,

Em brancas vestes núbeis, sepulcrais,

Acerca-me, ergue o véu, minh'alma inflama,

Ó! é a noiva morta há tempos atrás!

Fujo da aterradora e cruel visão,

Tento fugir do próprio sonho, tento,

Em vão, meu Deus! em vão, meu Deus!...em vão!

Lamento por mim mesmo, sim, lamento!

Vejo um carrasco eunuco dos frios trópicos,

Vestido em couro negro feito luto,

Luta contra infernos mitológicos,

E vence-os com um golpe fatal, bruto!

Ergue às trevas sedentas, inclementes,

A cabeça enforcada de Medusa,

Prepara o sacrifício das serpentes,

E oferece-o ao meu Sonho, e este o recusa!

Surjo diante de um velho cemitério,

Onde mortos sepultam-me à fria terra,

Meu Deus! é um Sonho insano, atro, funéreo,

Sei-o bem e sei que é em mim que não se encerra!...