DESATINO

Eu quero ser o espinho,

Não quero ser a flor,

quero andar em desalinho,

dispenso o traje a rigor.

Eu quero ser o vento forte,

Não quero ser a brisa leve,

Quero ser a casa sem suporte,

Construida sobre a neve.

Eu quero ser a capa de um livro,

Não quero ser o seu conteúdo,

Quero o título de um morto vivo,

Desejo o triúnfo do absurdo.

Eu quero ser a dura realidade,

Não quero ser a utopia,

Quero contemplar o caos da humanidade,

No mirante da agonia.

Eu quero ser o silêncio incontestável da dor,

Não quero ser a sua voz,

Quero ser o ódio competindo com o amor,

Numa velocidade atroz.

Eu quero ser sempre a dúvida,

Não quero ser a certeza,

Quero ser o banquete da vaidade estúpida,

Servida sobre a mesa.

Eu quero ser o medo,

Não quero ser a coragem,

Quero quer todo esse desatino,

Termine em um rio sem margem.