Diálogo com a inocência
"Por que, pobre criança
Por que motivo flagelas teu próprio corpo?
Refúgio de teu espírito
Casa da tua alma
Aconchego de tua vida?"
Essa carcaça fétida e decomposta?
Acaso pensas que conseguiria viver
Em um lar repugnante?
Isto que chamas de habitação
Não possui um forte alicerce
Por que razão manteria meu espírito
Em uma casa em ruínas?
"Em teus braços vejo sangue
Em teus olhos vejo morte
Em teu corpo decrépito vejo dor
Em teu coração...
...vejo nada!
Vejo um vazio
e nenhuma esperança!"
Um dia vivi em um mundo fantástico
Surreal
Irreal
Onde a dor nunca fora sentida
Onde o torpor anestesiava todo o incômodo
Toda a ânsia
Todo o medo
Fui expulso do paraíso
Onde esqueci minha força e coragem
Porque tu, inocência, me abandonaste!
"Deixa esta idéia, criança!
Tu não foste abandonado
Mas sim incitado a me rejeitar!
Seguiste o desejo lascivo de sua mulher
Foste hipnotizado por uma serpente
Seu veneno me expulsou de sua mente
E da mente de seu último ascendente!
Tu me expulsaste, ingênua e tola criança!"
Não acredito nesta lenda!
Não é justo o castigo herdado!
Carrego em minhas entranhas uma selvageria contida
Sim, nasci animal
E hoje sou hipocritamente civilizado
Abandonaste-me
Deixaste conhecer meu próprio corpo
Deixaste conhecer-me a mim mesmo!
"Tua selvageria assim te guiou
E agora sofrerás em uma competição
Sofrerás eternamente por amor
Angustiar-te-á com tua própria derrota
E incompetência
Vá e sejas um animal disfarçado
Teu corpo é pútrido por minha ausência
E sustentará tua alma inexistente"
Este monte de carne decomposta
É assim pela coragem ausente
Pela força inexistente
Morro aos poucos por não viver
Tiraste de mim a segurança
Deste a mim a desilusão
De viver em um porco mundo
Através de tua ausência me deste
A repulsa que tenho por este corpo
– agora aberto em fendas encharcadas de sangue!
(Agosto de 2005)