VERSOS DO IMPOSSÍVEL
Sentir saudades do tempo que nunca existiu
Amar alguém que nunca se quer nasceu
Caminhar numa estrada que ninguém construiu
Colher no jardim as flores que nunca floresceu.
Ouvir uma música que nunca conseguiram compor
Tocar uma melodia num instrumento nunca inventado
Realizar grandes edificações sólidas erguidas com isopor
Beber o elixir da vida sem nunca alguém ter experimentado.
Voar no imenso espaço azul numa nave nunca construída
Superar a velocidade da luz sem sair do mesmo lugar
Ultrapassar a racionalidade com a mente obstruída
Relacionar-se com as virtudes num estilo bem vulgar.
Sentir o medo de algo que nunca a ninguém assustou
Tomar banho numa chuva que não derrama água
Espalhar as parafernálias que auto se ajustou
Beber a fonte que teimosamente sempre deságua.
Queimar-se com o fogo que não emite calor
Degustar a solidão que proporciona multidões
Ficar mudo sem palavras mesmo sendo um falador
Jogar ao vento folhas brancas presas nos cordões.
Rabiscar as paisagens desenhadas no imenso céu
Borrar as estrelas que pulam no colo brilhante da lua
Engolir o silêncio e sentir dentro do estômago o escarcéu
Cobrir o corpo da mulher que não se encontra nua.
Recitar uma poesia que nunca foi possível escrevê-la
Subornar os gêneros e receber a honestidade da literatura
Fazer amor com a amada se nunca conseguiu nos braços tê-la
Exilar-se nos calabouços da mente e viver uma aventura.
Roubar um coração e viver na honestidade admissível
Matar o passado e o presente e rasgar o futuro que prever
Que os escritos tortos e sem rima deste poema impossível
O autor é sem dúvida um perdido se achando ao escrever.