Loucura de mim
É óbvio que todas as minhas loucuras são sadias. De cara já dá para perceber que sou um homem que segue na direção contrária, que tem ideais próprios e consciência político-social bem definida, que pensa e não se cala, que verbaliza os desejos e assume as consequências de vivê-los intensamente. Isso é loucura em dias atuais, onde todos - ou quase! -, estão embriagados com sangue amargo de uma vida capitalista desenfreada. O material é o principal. Você é o que tem, mesmo que isso implique em não repartir, em deixar à míngua. Valor invertido: material sim, humano, se sobrar. Ter, sim é muito bom ter, mas quero ser antes.
Quero te levar em lugares bacanas, cheios de pompa e muito glamour, você merece e te darei isso, mas não posso colocar minha vida, minhas forças nesse ciclo vicioso do ter, acumulando materiais para irem junto ao meu caixão. Eles se rasgarão antes, sei, essa é a função do acumulo.
Preciso estar confortável, não ser esnobe. Meu conforto, então, em minha loucura, se dá no momento em as pessoas que me rodeiam, principalmente os menos favorecidos por esse sistema podre, se tornem confortáveis também. Loucura isso! Mais é assim que meu braço trabalha. Minha consciência grita, mas creio que, tal qual João Batista, estou num deserto de corações ditos, sadios. Eu sou o louco, esqueceu?
Penso muito mais. Peso que um pôr-do-sol, uma chuva, uma onda batendo na pedra, possa nos proporcionar prazeres e sentimentos que jamais a prata irá comprar. Desceria para o Capão, com minhas correntes, neste exato momento, e contemplaria o Vale, por cima da Fumaça. Ali sim está a minha riqueza, a minha paixão!
Acredito no poder do amor. Através dele todas as pessoas precisam ser libertas, mesmo que isso implique em desafiar os dogmas sociais: seja mulher com mulher, homem com homem, feio e bonito, alto ou baixo, casados e casadas, ou até o trivial, o amor sempre será o mais importante. No final, todos estão à procura do amor. Essa busca não é estaque. Se o amor que você pensava ter encontrado em outra pessoa despedaçou-se, não desanime, ame mais, o mundo é enorme, existem pessoas na mesma proporção. Afinal, antes de tudo, você deve amar a si mesmo. Sua felicidade jamais poderá ser delegada a terceiros.
Sou louco pelo sorriso - dos meus filhos, então! -, pela alegria de botar o pé na estrada e desafiar o desconhecido. O povo da minha terra sofrida, contudo alegre, me energiza, a cultura popular dos “não” educados me atrai, me ensina e me transforma. Pessoas nos dão lições diariamente, mas crêem que isso pouco importa nos dias de hoje. Parece que isso é coisa de doido!
Piro quando posso contribuir e contribuo, mas me sinto o “Shindler” da história, sempre achando que fiquei aquém do que realmente poderia ter feito. Que estranho isso, num tempo onde fazer por si, é a tônica do jogo. Cara insano!
Sou louco por não ser o corretamente aceitável, por não ser exemplo de retidão, mas ainda assim sou seguido, admirado, desejado, quase idolatrado – momento narcisista!
Sou boêmio, gosto da noite, gosto de venerar as volúpias carnais que vão e vêm despretensiosamente e que, por vezes, concluem sua missão em algum canto. A carne me atrai, confesso, não há busco, mas há encontro em alguns momentos. Carne e amor, juntos, seria como contemplar o azul do céu, por fora do globo – será que a encontrei? Nunca me rendi aos dogmas e as vive tantas quanto pude. Santo e desvairado: não fui canonizado ainda.
E por falar em volúpia, não me basta o trivial entre os corpos, é preciso mais, muito mais. É preciso estar atento aos modelos combatidos pelos mais ortodoxos, estes são os melhores! Exploro cada milímetro do corpo feminino, bebo o suor do gozo, sem credos e sem amarras. Vejo, sinto e penetro as entranhas da alma, não apenas o orifício que separam um prazer, de outro. Permito-me abusar a alma feminina, mesmo que outras almas queiram se misturar – juntas? Delícia: rasgue a roupa e entre. Botão por botão tem sua vez e não é agora. Lambida, batida, cuspida, roçada, xingada, “na cama, na lama, na grama” – sua bênção poeta louco, bênça Gonzaguinha!
Caminhar, seguindo um caminho tão démodé, socialmente falando, é loucura! Sigo e deixo de lado as ranhuras que a vida me causou, aliás, elas nunca me pararam, pois preciso viver, me dedicar aos meus ideais não mais utópicos.
Loucura é viver todo esse turbilhão dentro de mim e seguir esperando a graça de encontrar alguém para ser minha linda “doidivana”, que me encha ainda mais de insanidades e maravilhas banais, que me diga que a loucura não é apenas uma dádiva exclusiva de Lecram: ela também fora agraciada.
Quiçá tenha te encontrado!
Dito isso, com dedos entrelaçados, então, seguiremos ouvindo, cantando, sonhando e realizando os mais loucos delírios...