Mentiras
As mentiras mais descomunais não me afetam
Se levo em conta todas as que represento
Pois, de tanto que finjo, não sei quem ser.
Tantas são as facetas que a original se perde...
Oh, poeta verbocardíaco, te aflijas a toda hora!
Não é possível conhecer-se sem ler-se,
Seja numa poesia ou num psicanalista.
Por que és tão falso contigo, mal-aventurado?
Perdes o desposo da consciência ou do pudor
Quando teu ego torna-se contuso e/ou confuso,
Quando teu coração amoroso faz-se moroso
Quando saúdas a saudade insana e insossa
Não menos desenxabida é a vida aos teus olhos
Que incolor o céu à tua língua bestial!
Tua pluma discorda de tuas calúnias e aleivosia
Teu embuste fracassa ante tuas composições
Além do compositor, descreve-se aqui ledor
Que de hipocrisia se veste e se banha
Fazendo da lavra do artista um espelho.
E este poeta, cujo coração pulsa nestas palavras
Tem sua confusa alma descrita em meia lauda,
Pobre poeta honesto, poeta verbocardíaco...