17 às 5h40.

Hoje descobri que sou louca. As pessoas sempre me diziam com sorriso nos lábios, e por um instante isso se despedia de meus pensamentos.

Realmente, eu não acredito na vida da forma como a vêem. Como talvez seja.

Não acredito no dinheiro, e estou certa de que seu valor é defecável. Ele vale quando o valor que a pessoa finge que paga é o valor que a pessoa finge que está satisfeita. Mal sabe a pessoa, que o valor que fingiu estar satisfeita é grandiosamente maior que o valor que a pessoa fingiu que pagou. Eu rasgo o dinheiro se for pra ter beleza.

Eu acredito na beleza da vida, simples como a memória corporal, simples como depois de anos as moléculas de um corpo reconhecerem quimicamente o outro corpo.

Eu acredito em coisas únicas e fantásticas, papéis voando pela janela. Fora isso, nada mais na vida tem sentido.

Simples, como ver sua avó bêbada, sorrindo porque acha graça.

Simples e belo como os momentos tristes onde a dor se torna plena e aquele sofrimento apertando o peito, comprimindo os 70% de água do qual seu corpo é formado, é o que se tem de mais cruel e mais valioso. É como se o sofrimento afogasse o corpo com o seu próprio líquido.

Assim como o embaraço de se ter duas costelas quebradas e estar numa cama de um quarto de motel. O que se diria, irônico. Acho que só assim um motel pode ser bonito. Só assim, especial, aconchegante e puro. Sincero.

Acredito nas pessoas, elas têm razões para serem estranhas. Hoje descobri que a população mundial, mais ou menos, o equivalente a 6 bilhões de pessoas são neuróticas ou psicóticas, o que torna o mundo um tanto quanto louco. A loucura é realmente muito louca. E é só parar pra pensar! Acho graça.

Eu me enquadro no clube das psicóticas por respeitar minha loucura; só ela é capaz de produzir encanto.

Odeio a censura com preferência no que tange o plano das idéias. Adoro inverter a ordem; viver as idéias e idealizar o real. O real com toda sua essência grotesca é digno de cor.

Não fosse encantador, também não o seriam os filmes de Almodòvar, e não existiriam as cores.

Gosto de filmes e sou compulsiva por chocolates. Amo o que dança e tudo o que nela dança; o ar, os olhos, o cheiro, o vestido.

O tic-tac do relógio me irrita no silêncio dos travesseiros, eles não têm beleza e belos assim o são quando se presta atenção no quão pacata e branca são as paredes do quatro. Ao olhar atensiosamente, agora até mesmo este momento tem som e possui todas as cores, branco de tic-tac. E por isso, é lindo... e irritante.

Amo cheiros, eles tornam o ar diferente. É a identidade. Até mesmo os cachorros usam do cheiro para se reconhecerem. Eles tornam cada beijo particular, não os cachorros, mas os cheiros. O cheiro do beijo.

Adoro baralho, família, música e bolinhos de chuva, especialmente os da minha avó.

Gosto do que não é normal. Hoje descobri que sou louca; primeira vez em que vi meus olhos no espelho desenhando os meus pensamentos, como se fosse um olho e um corpo, fisicamente separados. Ele pulsa. Hoje tive a certeza de que sou feliz porque estou só de passagem, acreditando em anjos cor-de-rosa em contos de fadas, porque amanhã posso já ter passado e as fadas não estarão mais lá, nem os contos, bem como os anjos, nem eu. E tão pouco serão cor-de-rosa.

Lu Pereira
Enviado por Lu Pereira em 10/10/2009
Reeditado em 10/10/2009
Código do texto: T1858042
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