Prece Noturna de um Nulo
Te peço, ó Deus, o prazer
De contemplar, dia-a-dia,
O desespero que dança
Diante do meu portão
E de acordar escutando
A sinfonia do caos.
Te peço, Pai, não dinheiro,
Como os fiéis filhos teus,
Mas um açoite divino
Sobre a minh’alma incréu;
Faz-me sentir o flagelo
De se estar vivo, vivendo.
Não quero a vida boa!
Eu quero as dores reais!
Como cigarro na pele,
Eu quero é ser torturado
Pelas verdades ocultas.
Poder andar de mãos dadas
Com as mazelas do mundo.
Dormir despido no frio
Das falsidades humanas.
Sentar-me à mesa e comer,
Em companhia do ódio,
O pão mofado do amor.
Dá-me a tristeza diária.
E ao redor de meu leito,
Nas noites de solidão,
Acampa um anjo da guarda,
Pra que ele veja o meu choro
E o meu sorriso iludido, Pai,
Enquanto eu sonho com ela.
Aceita, Pai, esta prece
Deste teu filho maldito,
Este teu filho que espera
Somente dor e fracasso.
Me ampara, Pai Protetor,
E livra o meu coração
Da aspiração de ser bom;
Amém.