Patíbulo
Ao som do rufar dos tambores
Aos tremores da mão do verdugo
No momento do nó da forca
Feito com esmero e crueldade
O infinito instante da quase-morte
A sofreguidão da respiração cortada
Em fatias finas pelo oxigênio ausente
dos pulmões solitários e frios
Ajeitar no pescoço o nó da forca,
A lâmina fria do machado,
A guilhotina rápida e certeira
O gás invisível e letal
Ao subir ao patíbulo
Produzirei o último movimento do corpo
O pensamento fugidio se esvai pelas pernas abaixo
Descendo ao chão e sumindo dentro do ralo
E escapando do catre.
Ao som do rufar dos tambores
Não lembro mais de minha face no espelho
E nem mesmo refletida
dentro dos olhos de meus algozes
O afiado cutelo reluz feito ouro
O sol dessa manhã que ecoa
no silêncio pranteado da praça
chorando pelos orvalhos do inverno
A túnica que visto manchará minha morte
de resíduos de panos e tramas
Os lábios boquiabertos sem palavras
Dizem tudo e ao mesmo tempo
nada
É a perplexidade, a verdadeira
forca contemporânea
a sufocar poetas e loucos
Que divagam pelos escaninhos do tempo
Em busca incessante de
alguma sensibilidade humana possível
e razoável
Subir ao patíbulo
E alçar o infinito da morte
Sem acenos, bilhetes ou razões românticas.
Morrer faz a última diferença na estória
O resto é lembrança ou memória intermitente.