ÊTA VIDA !

Você lembra, minha querida,

( Pergunto, por perguntar,

Pois não lembra da comida

Que comemos no jantar ).

Daquele tempo de moços...

Que a vida era um colosso ?

Eu, de cabelos dourados,

Topete bem engomado,

Barriga reta e dura,

Olhos azuis, cor do mar,

Tinha alta estatura

E belo brilho no olhar...

Você então, uma uva,

Cabelos negros como breu,

Corpo perfeito em curvas,

Que olhos lindos, os seus !

Pele era aveludada,

Requebrado inebriante,

Quando a via pelada,

Que coisa mais excitante !

Agora, minha véia Cida,

Quase no fim da vida,

Como tudo é diferente...

O que ocorreu com a gente :

Aqueles meus cabelos,

Sinto vontade de tê-los,

Mas não os tenho mais,

E topete... nunca, jamais !

A barriguinha que eu tinha,

Você achava uma gracinha,

Hoje, melancolia...

Parece uma melancia !

Os olhos azuis, minha gata,

( Chamo assim para agradar )

Hoje sofrem catarata

Que me impede de enxergar.

Quanto à alta estatura,

Agora tá tudo encolhendo,

E aquela coisa outrora dura,

Sinto que está morrendo...

E o brilho no olhar,

Este eu posso conservar,

Com as lentes de alto grau,

Mesmo assim, enxergo mal.

Você que era uma uva,

Continua, mas agora é passa,

Nem com cremes e luvas,

Suas rugas, não disfarça.

Cabelos negros não mais são,

Ora são brancos como a cal,

As curvas do corpo estão mal

Mais parecem massa de pão !

Aqueles olhos seus,

Coitadinhos, como os meus,

Usam óculos graduados

E o brilho ficou embaçado !

A sua pele aveludada,

Assim como numa trombada

Ficou toda enrugada.

E o andar, como o da impala

É feio e só com bengala !

Que bom, vê-la pelada,

Mais na época passada,

Hoje este corpo horrendo...

Quando vejo, saio correndo !

É... Minha querida véia,

A vida é mesmo assim,

A gente era tetéia ,

Mas nela tudo tem...

Nesse nosso vai-e-vem,

Começo, meio e fim !

Porém, não esquente, meu bem,

Sei que você ainda me ama,

E nunca de nada reclama

Por isso, a amo também !

Auro.