NASREDDIN-HODJA E ZALINA IX/X

NASREDDIN-HODJA E ZALINA IX – 1º JUL 2022

Nasreddin se inclinou pela janela

e por ali indagou ao visitante

o que queria nessa noite bela...?

Mas ele silêncio manteve nesse instante,

só continuando a bater, sem mais cautela,

até Zalina se acordar, bem discordante:

“Vai logo ver o que quer o desgraçado!

Desce essa escada!” – seu tom mal-humorado!

Nasreddin concordou com um suspiro

e desceu os degraus até a porta;

e quando a abriu, no trinco dando um giro,

falou o homem, com voz de quem se importa:

“Desculpe, irmão, mas é assim que me viro,

não tenho emprego, qualquer coisa me conforta,

dinheiro, refeição ou alguma roupa velha,

peço um pedaço de pão, não carne de grelha!”

Nasreddin hesitou por um momento

e então o convidou para subir a escada;

o mendigo se alegrou: Hoje ao relento

não vou dormir, mas aqui terei pousada!”

Mas o turco em sua cadeira tomou assento:

“Meu caro amigo, não posso te dar nada!”

Bem que sentira o bafo de cachaça,

que a respiração do outro forte passa!

“Por que não me disse lá embaixo, meu irmão?

Sem me fazer subir a sua maldita escada...?”

“Porque você não me fez sua petição

quando cheguei à janela e só pancada

continou dando na minha porta sem razão:

e minha escada ainda chamou de amaldiçoada!

Pois não lhe darei um níquel para a canha,

em recompensa por incomodação tamanha!”

O pedinte ainda começou a reclamar,

mas Nasreddin apanhou a sua bengala:

“Dê o fora daqui, sem mais tardar,

saia logo de dentro de minha sala !”

E o importuno, ao vê-lo levantar,

saiu escada abaixo, feito bala!

Nasreddin o acompanhou, mais devagar,

para a porta da frente enfim trancar!...

NASREDDIN-HODJA E ZALINA X – 2 JUL 2022

Mas nem sempre Nasreddin tudo ganhava,

que sua esposa, Zalina, era teimosa

e em muitas coisas, sem razão, o contrariava;

Nasreddin não discutia com a rançosa,

mas quando ela rezingava, se calava,

pois fora disso, era bastante carinhosa,

até que um dia a sua paciência terminou

e por uma vez, ele mesmo a contrariou!

Estavam os dois sentados no jardim,

tarde outonal, a contemplar paisagem,

quando no céu um triângulo carmesim

apareceu. Era um bando bem selvagem

de gansos arribando, que era o fim

do outono, demandando outra paragem,

como sempre em formação de “V”,

o que ia à frente como sendo o alfa se crê.

Na verdade, sempre o da frente sofre mais:

é ele que abre a passagem pelos ares

e atrás dele, por instintos naturais,

voam os outros, a enfrentar menos azares,

aproveitando os fluxos habituais

da camada de ar aberta aos pares

e tão logo o ganso da frente se cansar,

deixa seu posto e toma outro o seu lugar.

Mas Zarlina, por simples brincadeira,

disse ao marido: “Esse primeiro é meu!”

Por uma vez, ele discordou da rezingueira:

“Não, querida, o chefe da casa sou eu!”

E seguro de ter razão certeira, ele afirmou:

“Esse primeiro é a mim que pertenceu!”

Mas a mulher já reclamou na hora:

“Esse é o meu, sem discussão agora!”

Mas nesse dia, estando sem paciência,

Nasreddin não quis com ela concordar:

“Não mais vou suportar sua impudência,

queres sempre minhas ideias contestar;

hoje o primeiro é meu, tenha ciência!...”

“Não, é meu, é meu e eu vou ganhar!”

Zalina estava muito mal-acostumada,

por seu marido jamais sendo contrariada!