O AGENTE DE ABRIL
«Dedicatória a todos os agentes da Festa de Abril –
– Os confinados do esquecimento»
Ouvem-se ruídos pelo jardim
Mesmo à entrada do Parlamento.
Serão vírus ou será gente,
Ponderou para si mui atento:
- Gente, não será, certamente…
E os vírus não entram assim!
- Tenho máscara estou descansado
E escuso de me apoquentar.
Tenho a metralha bem afinada
E, se houver mesmo algum azar,
Disparo logo uma rajada…
Ou não estivesse eu confinado!
- Alto aí!... Quem é que vem lá?
Vê-se mal, pois está nevoeiro
E já é bem tarde, p´ ra caraças,
S´ aparecer alguém, serei o primeiro
A despachar duas chumbaças
Que a Grande Festa é já amanhã!
Surgiu um vulto afantasmado,
Vulto de mulher com grande abada,
Parecendo esconder mercadoria
Um pouco leve, mas camuflada.
- Alto aí!... Que levas em demasia
Nesse regaço tão disfarçado?
- Não receie, senhor Agente, são cravos
Que trago para este Parlamento,
Para quem nele vai discursar…
E, desde que não haja ajuntamento,
Dará boa saúde e fará animar
E deixará cheirinhos e desagravos!
- Bem, bem, pode passar. Mas atente:
Ponha a sua máscara e diminua
A encomenda. Eles nem chegam a cem…
- Mas estes Ramos são da minha rua
E quero-os dar em troca dum amém
Da boca de quem fala e nunca mente!
- Oquei, entre, e ponha-os na entrada
Que eles, ao vê-los, os tomarão
Pois são leves e não têm espinhos,
E até são da cor da celebração.
E porque não exigem pergaminhos
Só favorecem esta Jornada!…
E assim cumpriu o Agente de Abril,
Lavando as mãos, à confiança:
- Mais cravos, menos cravos, afinal
Não comprometem a segurança
E esta Festa, neste nosso Portugal,
Bem merece Cravos, mais de mil!
Frassino Machado
In ODIRONIAS