Tostadeira

Fui à cantina comprar pão

O pão que salva as vidas

Das vidas que vivo em vão

Quando o estômago dói

O pão da padaria

Revendido a um preço alto

Nas janelas abertas

Fechadas para favores

O cheiro perdido

A quentura já extinta

As migalhas mais activas

O miolo endurecido

Mais de um quilómetro a andar

Debaixo de um sol ardente

Para pagar o preço injusto

Da mísera refeição

Quantas calorias perdi

Mesmo não tendo alguma

Para ganhar no processo

Trigo, sal e saliva

Não bastava o castigo

De viajar sem guarda-chuvas

Para me guardar do sol

Que não soube se encolher

Atirei-me inteiro

À violência costumeira

Na luta de quem só quer

Matabichar primeiro

Sobrevivi à guerra

De homens e mulheres

Cujos estômagos roncavam

A poucos metros do desmaio

Mas até chegar à mesa

Já não tenho os mesmos pães

Já estão frios, quase moles

De oferecer aos cães

É uma irritação pequena

Porém vale a pena

Apenas uma vez

Que há tostadeira em casa.

Widralino
Enviado por Widralino em 30/10/2018
Código do texto: T6489791
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