PORTAL DO TEMPO PARA O BOCA DO INFERNO
Na Lagoa do Abaeté
Eu gregoreio como um mané,
Desse floreio, com tanto carinho,
Percorro as ruas do Pelourinho.
Sei o que a baiana tem
E me mareio do Mar de Caymmi,
E Jorge Amado vai sempre bem,
Salvador de todo mal me exime.
Já lhes cantei o canto gregoriano,
Espero não tenha entrado pelo cano!
Acontece de meu amor por Gregório
De Matos ser dos mais contraditórios.
" Maledicências correm pelo convento,
A superiora madre tem grande fama
E há o poeta que a todo momento
Faz troças às noviças que chama.
As freiras em fila indiana
Procuram pela grande mestra
E essa, cuspindo, qual lhama,
Perdigotos, diz : - Dar-lhe-ei soco na testa!
Freiras e noviças em polvorosa -
Nossa madre mater vai ao estafermo,
Deus há de dar-lhe força ao termo !
Num dos cantos u'a noviça goza.
Sai pelas ruas de Salvador,
Em busca do poeta blasfemo,
Procissão carmelita sem andor
No mister de afrontar o Demo.
Como Jesus pregando aos apóstolos,
Gregório canta suas rimas,
Poemas para rir, poemas ósculos
E com métrica tudo em cima.
A madre posta-se altiva, sardônica,
Bracinhos cruzados, terço balançando.
As freiras já sorriem de suas cômicas
Palavras ferinas, que vão chegando.
- Dizem, poeta, que és famoso em Salvador,
Que ufana-te das rimas que soltas,
às noviças meigas revoltas,
Mas vendo-te, digo : Sois pica-flor !
As freiras riram alto, até forçadas,
O público também se riu mesquinho,
Afinal, choque estranho, dos diabos,
Logo ali, nas ruas do Pelourinho.
Gregório aguardou o silêncio,
Ao começar parecia o Élvis,
Saracoteava obsceno a pélvis
E o pinguelo virou ponte pênsil -
Se me chamas pica-flor,
Pica-flor é o que alegas,
Trago-te cá a pica em ardor...
Mas há flor que tu carregas...
Vede, enquanto trago a pica para cima
A senhora traz a flor sob a batina.
Já que possuo esta pica
E tu, a flor : Claro fica,
Pica-flor !
A freira toda indignada
Foi-se logo sem dizer nada...
Aos que apontavam ao caderno
Gritou : Este é a Boca do Inferno !