Falta de assunto

Não queria falar da morte.

Dizem que é coisa de velho.

Ou dos que na fila

acabam de ingressar.

Mas ela, a fila,

única é.

Democrática!

Anda sempre,

nunca parou.

Ninguém dela escapa:

nasceu, entrou!

Furá-la, há pouco interesse.

Nem precisa guardião.

“Por favor, primeiro as damas”

“Não obrigado, não tenho pressa”

“Hoje não”

Não queria falar da morte.

Mas sempre chega um tagarela,

e traz à tona a questão.

Como se propaganda faltasse...

“Morra hoje e viaje

a Paris, com acompanhante

sem custo,

tudo de graça.

Chance de ocasião”???

“Paris ? Já conheço , obrigado”!

Tenho medo de avião”.

Não queria falar da morte.

Parece falta de assunto,

ou excesso de defunto.

Morte rima com sorte.

Vai ver que do outro lado é bom.

Se fosse possível pular,

chegar lá sem que ela visse,

espiar e voltar logo,

ficar, só se for por chiste.

Não queria falar da morte.

Mas só apagando tudo:

Rádio, TV, laptop,

a luz , se preciso for.

Teria medo a poderosa

de no escuro vagar?

Quem sabe ficando confusa

eu lhe escapasse do olhar,

e o felizardo trocasse, ufa!

Que Deus o tenha em bom lugar!