No céu não tem trabalho

(Produzido através de um sorteiro de dois substantivos: Céu e Trabalho)

Era um homem distraído,

Quem nem viu desfalecido,

O seu corpo a morrer.

Acordou como de sempre,

Quis marmita, beijou Irene,

Que tal qual uma sirene,

Chorava de doer.

Mas porque tanto choro?

Olha aqui o seu esposo!

Já pensou no seu desgosto?

Se eu não estivesse aqui?

Levanta minha filha,

Estou cheiro de tarefa,

Meu trabalho me espera,

Acordei com tanta pressa,

Que nem sei o que o que fazer.

Ela há de levantar,

Mas só soluçava e chorava,

Resmungava algo baixinho:

“Eu te disse Agostinho”

“Seu trabalho ia te matar”

“De trabalho vai morrer”

Quando disse que nem morto estava,

E fui pegar a minha enxada,

Minha mão passou no nada,

Sem conseguir segurar,

Tentei de uma a três vezes,

Depois mais quase oito vezes,

Tentei até cansar.

Foi quando percebeu que tinha asas,

Percebeu tinha morrido,

Entendeu agora o fato,

Deixava Irene sem marido,

E o pior: a terra sem arado.

Pensou que muito tinha,

Trabalhado toda hora,

E nos momentos de folga,

Muito mais ele trabalhava,

Irene sempre dizia,

“Descansa um pouco Agostinho”

Trabalho bom é trabalho justo,

Trabalho ruim é quando é muito,

Trabalha tanto que se mata.

E não é que morre mesmo?

Se for sonho ou pesadelo,

Eu juro, eu prometo,

Que vou dar uma descansada.

Depois de duas beliscadas.

Viu que ainda tinha asas,

Irene soluçava,

Morri e nem tem volta,

Chegou mesmo minha hora,

Uma luz veio de cima o puxou,

Agostinho batia asas tal demente,

Mas a puxada era tão forte,

Que se já não fosse a sua morte,

Morreria novamente.

Chegando lá em cima

Viu um tanto de Santo,

Que de tanto Irene acender vela,

Mulher de tanta fé,

Pensou rápido, teve ideia,

De pedir algo pequeno,

Escolheu o mais sereno,

Fez um pedido a São José.

José meu grande amigo,

Lembra-se do domingo?

Eu nem lembro mais as rezas,

Mas Irene, lá na terra,

Reza tanto quanto dois,

Reza por mim e por ela,

Mereço mais um pouco de vida?

Minha mulher que Deus a tenha,

Esta ficando quase morta.

Tem ficado tão viúva.

Quem viu que as saúvas,

Tem comido a horta dela.

Se eu descer mais um pouquinho,

Pensando já na frente,

Prometo com carinho,

Dividir minhas tarefas

Seis dias cuido da roça,

E um dia inteiro de Irene.

São José sorriu de lado,

Agostinho meu querido,

Impossível que não tenha percebido?

Não há quem tenha assim morrido,

Que tenha ficado preocupado

Com as terras ou trabalho.

Deixaste Irene lá sozinha,

Lembra-se do viúvo?

Aquele da vizinha?

Está lá já dando em cima.

Pra você meu grande amigo

Digo uma coisa com cuidado

Senta e descansa um pouquinho

No céu não tem trabalho

Agostinho bateu asas.

E sentou pra descansar.

Nunca nem tinha descansado.

Há quem diga que chorou.

Chorou um pouco, chorou muito.

Que depois do enterro do defunto.

Choveu seis meses sem parar.

Das terras secas de outrora,

Agora, tudo que lá planta dá.

Agostinho lá de cima

Toda vez que a saudade bate.

Chora em cima da cidade

E chove sem parar.