PROMESSA MÓRBIDA
Não vou morrer!
Isto não se discute,
Pois vai que a morte escute
E me mande um clarim.
Não acreditarei no meu fim,
Nem naquela agonia,
Pois assunto de lápide fria
Não se põe à minha mesa.
É como simples certeza
Do sol depois da chuva.
Não há o que revidar
Como o vinho é da uva
E teu sorriso ser sedutor,
Pois se a morte é faltar amor
Ainda suspirarei paixão,
Mantendo o fraco coração
Até o próximo espasmo.
Isso será melhor que o marasmo
De ficar vivo nas letras,
Nos choros, nas melodias
De saudades e roupas pretas.
Não vou morrer
E ter meu reconhecimento só depois
Quero agora, quero a cada hora
Se merecer ser reconhecido,
Pois todo caminho comprido
Tem paragens e algum valor,
Tem gotas de suor
E outras de orvalho.
Não vou morrer,
Carpideiras me fazem rir
E já sei o que há de vir
Na madrugada do meu funeral:
Alguns chorando,
Outros me querendo mal
Ainda, mesmo se morto.
E as mulheres sem conforto
Querendo outro eu – mais um:
Não que eu seja incomum,
Mas não julgo seus modos...
Porém, se isto acontecer
Procurem um bom epitáfio
Que explique meus porquês,
Já que não mais poderei
Afirmar que procuro ser justo
E que não vou matar de susto
Os injustos julgadores.
Só me restará algumas dores:
As das lingeries que não te tirei;
E de não fazer valer a promessa
Que sempre proferi:
Eu não vou morrer (não cumpri!).