Na verdade sei...

O mal da humanidade

É essa tal de ignorância,

Que destrói nossas vidas

Desde nosso tenra infância!

Mas vejamos meu amigo

Que tem homens letrados,

Não sabem ser humildes

Por se acharem adiantados!

Quando a morte bater

Bem firme na sua porta,

Vai ver que não vale nada

Isso agora não importa!!

Vendo a roça crescer

Lá está o trabalhador,

Sem estudo e sem destino

Substituído por um trator!

Chora a mágoa do momento

Da vida não leva nada,

Busca no arquivo da lembrança

O quanto tinha esperança,

De vencer essa jornada!

Mas lá está o sertanejo

Na luta para sobreviver,

Mesmo sem instrução

Sempre pensou em vencer!

Relembro suas palavras

Quando lá fui ti visitar,

Deitado em sua rede

Desse jeito passou a contar:

Que sodade da minha roça!!!

Da abastança e da fartura,

Minha roça era florida

De dá inveja na criatura!!

Ali criei meus fios

Vi crescer até os neto,

Ninguém nunca passou fome

Nem drumiro sem um teto!!

Derrubei muito mato

Infrentei onça pintada,

Já raiei cum boi brabo

Já matei cobra na enxada!

Sei lê não cumpade...

Instrução nunca pricisei,

Só fisso rabisco no chão

E minha inicial no arreio!

Lê no livro nem pensá

Tempo pra isso num existia,

A roça era o único caminho

Que nóis percorria!!

refrão

chora a mágoa do momento

da vida não leva nada,

busca no arquivo da lembrança

o quanto tinha esperança,

de vencer essa jornada!!

Naquele momento de sespero

Vendo em mim uma esperança,

Me pede com voz embargada

O que lhe veio na lembrança!

Por favo,leve meus fio a escola

Meu cumpade tenha pena,

Tenho neto jogado no mundo

Sem instrução num vale a pena!

Vai na casa da Tiana

Peça ao Juca que vem cá,

Pega o porco no chiquero

Que é pra mode nóis matá!!

Busca a pinga na cabaça

Ta pindurada no paio,

Pega a lenha e põe no fogo

Pra mode o fjão cuzinhá mio!!

Pede a Joana pra chamá a Sefa

Pra ajeitá a cozinha,

Vai chegá muito parente

Lá de perto da lagoinha!!

Vem Zé Pedro e Chiquinho

Cumpade Ontonho e Mariana,

Vem Geromim e Sandoval

Vem Durvalino e Jão Mendanha!!

Esse povo ta chegano

Vem a pé e de carroça,

Vem parente da cidade

E muita gente da roça!!

To alegre meu cumpade

Apesar de muita dor,

Sei da hora verdadeira

Pois já me disse o seu doutor!!

Dessa parentada que aí vem

É pro mode meu istado,

To perrengue a muito tempo

Nem vô mais ao roçado!!

Tenho idéia do que vai sê

Quando minha hora chegá,

To cum medo não cumpade

É mió eu ti ispricá:

To sofreno de nevragia

Seu dotô me disse isso,

Que é mio eu discansá

Sem fazê mais cumpromisso!!

Continua....

To ca perna sem mexê

O joei ta muito dilurido,

Acho qui acabô a graxa

Ta sempre dano ringido!!

O braço nem se mexe

A cacunda faiz me dá gemido,

O pescoço num qué virá

To cum baita dor no zuvido!!

A barriga dá dilurimento

Num sei o que acontece,

As carça num para mais

O imbigo ta qui cresce!!

Seu dotô já me falô

-seu Quinca, preocupe não,

Isso deve passar logo

Com dois metros de caixão!

O dotô é bão dimais

Foi direto no assunto,

Sei qui vô morrê mermo

Já to pareceno um difunto!!

Vô distribuí minhas coisa

Deixo os porco pro meu fio Zé,

Dexo a ispingarda pro Antonho

A casa fica pra minha muié!

A bicicreta vai pro Junin

Meu neto que admiro,

Meu cavalo vai arriado

Pro meu fio Argemiro!

Tenho um relógio de borso

Que ganhei do meu avô,

Esse vai de presente

Pro meu amigo, seu dotô!

Teve tamanha paciença

E tulerança cumigo,

Que esse relógio de borso

É presente de um amigo!!

Minhas butina ainda nova

Vai ficá pro Gerardo,

O cinturão da cintura

Dexo pro meu neto Ricardo!

Aquela carça de argudão

Vai ficá ali pindurada,

Pra quando a muié arranjá oto

É pra ela sê bem respeitada!!

As cueca num importo

Tão toda meio furada,

Ninguém vai querê mermo

Num tem sirvintia de nada!!

Minha enxada duas caras

Vai furar minha cova,

Meu machado e meu cuitelo

Deixo pra minha fia mais nova!!

Ela que tanto me ajudou

E deu conta do recado,

Nunca me abandonou

Na capina do roçado!!

Vô dexá meu facão

Aquele, cabeça-de-cachorro,

Com meu cupade Zé divino

Que mora em cima do morro!

As vaquinha vai ficá

Sabe como que é,

É mansinha do terreiro

Vai ficá pra minha nuié!!

Agora o que me resta

É quato nota de dinheiro,

Duas de cinco e uma de deis

E outra de dois cruzeiro!!

Esse dinheiro vô dexá

É pro santo de devoção,

Vô mandá argúem dexá

Nos pé de são Juão!!

Sei que logo vou partí

Dessa vida, a qualquer hora,

Dexo meus trem repartido

E vou com Nossa Senhora!!

O Sertanejo
Enviado por O Sertanejo em 27/11/2009
Código do texto: T1947353
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