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Dona Morte Me Avise Quando Eu For Morrer



Dona morte me avise quando eu for morrer, pra eu tomar todas até o amanhecer, correr pelado na rua e a polícia me prender;

Dona morte me avise quando eu for morrer, pra eu andar na chuva sem medo de gripar, pedir um cafuné com quem eu me encontrar e fazer amor até me acabar;

Dona morte me avise quando eu for morrer, pra eu arriscar sem medo de errar, ver filme com pipoca até não agüentar e ouvir música sem vergonha de chorar;

Dona morte me avise quando eu for morrer, pra eu ir para os cantos sem hora de chegar, conhecer gente sem me apegar e distribuir dinheiro pra quem quiser pegar;

Dona morte me avise quando eu for morrer, pra eu ir ao cinema e não parar de conversar, ir a um rodízio sem dinheiro pra pagar e terminar o dia rezando em um altar;

Dona morte me avise quando eu for morrer, pra eu me encontrar com velhos amigos que amizades já não há, beijar quem eu não gosto e inimigos adorar;

Dona morte me avise quando eu for morrer, pra numa maratona eu me inscrever, me matricular em aula de piano e latim pra me entreter;

Dona morte me avise quando eu for morrer, pra uma mulher bonita eu conquistar, vestir traje a rigor e leva-la pro altar, depois pedir divórcio e em um bordel eu ir morar;

Dona morte me avise quando eu for morrer, pra um comício eu realizar, juntar muita gente em volta com discurso a declamar, me candidatar a presidente e nem em mim mesmo votar;

Dona morte me avise quando eu for morrer, pra eu rasgar meus livros e sapiência eu esquecer, não lembrar das normas e das rotinas sem lazer;

Dona morte me avise quando eu for morrer, pra eu faltar trabalho em troca de cantar, em uma roda de samba ou sinfonia de Bahr;


Dona morte me avise quando eu for morrer, pra fazer toda semana festa pra valer, e quando chegar o dia, encher um barco de mulher e no mar desfalecer, com a foice da morte e suas garras a me prender, me olhando feio com uma cara de temer, cara de papangú com fome só olhando para crer, e eu sorridente agradecendo o meu viver, morrendo numa boa e extasiado de prazer, que destino cruel coisa de não se esquecer, obrigado Dona morte pelo aviso dado, o aviso prévio e derradeiro de morrer.

O Poeta do Deserto (Felipe Padilha de Freitas)
Enviado por O Poeta do Deserto (Felipe Padilha de Freitas) em 21/08/2009
Reeditado em 12/02/2011
Código do texto: T1766512
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