A velha da cadeira de balanço
A velha da cadeira de balanço
Cabelos brancos, pernas cansadas
Mãos queimadas das cozinhas da vida
A velha na cadeira se balança
E conversa com suas lembranças
No meu tempo de criança
Moça bonita não mostrava o peito
Gritar, ou xingar os outros era falta de respeito
E havia tanto preconceito
Que era melhor freqüentar o mesmo leito.
Amante vivia do sonho e de esperança
Menino jogava bola de gude
E menina brincava de boneca
Para espôsa só moça donzela
Cabelos tingidos, pernas cruzadas
Toda a pele bronzeada nas máquinas da vida
A gata na cama se estica, se mexe,
Faz mais uma pirueta, e grita para seu amante
Vê se na próxima não me deixa correr risco
Melhor ficar brincando com meu peito
E deixar de tanto preconceito
Pois sei que tens mesmo é “outro” eleito!
E a velha conversa com suas lembranças
Não se abaixava, pois aparecia o fe-ó-fó
A amante se arrasta, e lambe e engole
Desaforos, prazeres, mata a sede
De todos e morre sedenta de encontrar
Um verdadeiro touro
A cadeira de balanço pende para o lado
A velha morre e é logo esquecida
A amante vê seu eleito com o peito ferido
Pular para outro leito, e diz que não mudou de partido
Neste tempo, tudo é diferente
As amantes são caçadoras
O homem não tem mais virtude
Preconceito não mais existe
Menina joga bola acerta o chute,
Menino brinca de ser boneca
Espôsa só se for mesmo, desonesta
E mentirosa para aguentar tanta loucura.
Tem agora uma nova Ética
Que soa melhor como Ótica
Onde se fabrica um
Par de óculos
E tudo fica melhor,
Diz torcendo a mente
Distorcidamente
Sei lá acho que a lente mente.
Não é a mente que ficou fraca
É nossa gente que fracassa.
E tropeça em tudo
Como a velha na cadeira de balanço
No outro dia não passa de mero embrulho
Jogado num monte de entulho.