COSTURANDO TEMPO
MARIA ALMEIDA
Minha mãe
A que também partiu
com uma lata na cabeça
Subiu o rio com seus sonhos úmidos
Cortou os cabelos na viagem
E vestiu o branco da cura.
Em seus braços fui embalado
O primeiro dos sete filhos
Que a força dos dias fez crescer.
Minha mãe
hoje sei...
Você me ensinou a imaginar
O impossível com os dedos.
Nos desenhos infantis viu mais
Do que rabiscos
E um sorriso longo acompanhou meus dias
O traço incerto
Iniciado antes do meu nascimento.
Os anos que venceram seus cabelos negros
Também embaçaram seus olhos
Não a força de amar escrita nas muitas noites de solidão
E a mesma maquina costurando o tempo
E suas mãos tateando os móveis
A toalha rendada trazida de tão longe
O velho relógio com suas cordas cansadas
A cama da infância que perdeu sua cor
No quartinho das lembranças
Com suas fotos desbotadas e a mesma alegria
Inaugural dessa viagem
Iniciada há muito tempo
Ainda carrega o frescor da saudade.
Ricardo Nonato 16.09.13