Reminiscências – A Casa em que nasci
Nossa casa foi construída
Sem vizinhos vejam só
Com vista pra linha do trem
Lá no bairro do Sengó
A casa em que nasci
Era grande e amarela
Com assoalhos rangedores
Quando a gente corria nela
Minha família era grande
Onze pessoas nela residia
Nossa casa era aconchegante
Não tinha melhor moradia
Enormes janelas ela tinha
Mas de uma me fez amarra
Ficava defronte a uma lagoa
Onde os sapos faziam algazarra
Tinha um belo fogão à lenha
Onde tudo se aquecia
Até mesmo a água de banho
Tomado em enorme bacia
Ah, e no porão de nossa casa
Quanta coisa ali contida
Selas, ferramentas e outras tralhas
Que “Seu Cotia” usava na lida
Para guardar os mantimentos
Uma despensa muito rica
Nela, um moinho de café
E um pilão pra paçoca e canjica
Na cozinha não tinha forro
E fogão aceso todas as manhãs
A fumaça era uma constante
Formando cortinas de picumãs
Sobre o fogão, pedaços de bambu
Estavam sempre pendurados
Repletos de lingüiças e toucinhos
Que pra comermos defumados
Ao abrir a porta da sala
Avistava-se um lindo mangueiro
E um paiol repleto de milho
Que pra durar o ano inteiro
Pela porta da nossa cozinha
Topava-se com um largo terreiro
Um caminho pra bica d’água
E de frente um galinheiro
Em frente de nossa casa
Um belo jardim se exibia
Era o mais lindo dos jardins
Era o orgulho de Dona Fia
Nas paredes de nossa casa
Muitas molduras de recordação:
Dos retratos de nossos avós
Aos santos de nossa devoção
No pomar de nossa casa
Tínhamos de tudo plantado
De um enorme pé de caqui
A um pequeno fruto importado
Nossa horta era imensa
Que espelhava muitos cuidados
A todos uma parcela de tarefa
Prá ficarmos bem alimentados
Como era farta a nossa casa!
E hoje uma pergunta me vinha
Como podíamos ser tão ricos?
Se dinheiro lá ninguém tinha?