ÁRVORE GENEALÓGICA

Eu vou tentar futucar

As gavetas da memória

E peça a peça montar

Um pouco de minha história.

Vou deixar pra meus bisnetos

Este pequeno relato,

Vou ressuscitar afetos,

De onde foi que eu vim, de fato.

Vou falar da nossa vida

Sem evitar emoção,

Pois a história pretendida

Quer falar do coração.

Não vou começar, decerto,

De remota geração

Fá-lo-ei com a que mais perto

Pôde alcançar minha mão.

Já estava na eternidade

Meu avô – morreu bem moço;

Nunca tive, na verdade,

Um avô de carne e osso.

Martinho, meu avô paterno,

Foi um grande professor,

Foi temente ao Pai Eterno

E ensinou com muito amor.

Minha avó, mãe de meu pai,

Eu também não conheci,

Mas ouvi-lhe a voz, seu ai,

Nas cartas dela que eu li.

Era muito inteligente,

Poetiza de alma pura,

De caráter forte e mente,

E de pequena estatura.

Seu ventre gerou dez filhos

Saudáveis, inteligentes,

Que não saíram dos trilhos;

Foram boas as sementes:

Foi José Batholomeu

Que inaugurou a fileira

O primeiro a ver o céu

E o afago da parteira.

De caráter impoluto

Nas atitudes, valente,

Perspicaz e muito arguto

E de palavra fluente.

O segundo foi poeta,

Nasceu Raimundo Nonato,

Amava a rima seleta,

A boemia e o prato.

Dosanjos foi a terceira,

A mestra por excelência,

Ensinou a vida inteira

Sem perder a paciência.

Juca Salles, o artista,

Chegou para fazer rir,

Foi o maior humorista

Que me aprouve assistir.

Em seguida Marieta,

Muito arguta e inteligente,

Tinha aparência discreta

E palavra convincente.

Antônio nasce perfeito,

O mais baixinho dos varões,

Doutor nas leis do direito

E na língua de Camões.

Fecunda, dona Etelvina,

Traz à luz uma outra vida,

Foi uma outra menina

Que se chamou Margarida.

Vem Francisco na seqüência,

Que virou Padre bem cedo,

Já mostrava essa tendência

Desde os tempos do brinquedo.

E como se não bastasse

Minha avó pare outra vez

E a alegria põe na face

De Maria das Mercês.

E por fim nasce um arauto

Do direito, sem desdouro,

O nome dele é Adaucto,

Fechou com chave de ouro.

Não falo do meu avô

Materno, também pudera:

Nunca soube ele, quem sou,

E nem eu quem ele era.

Conheci vovó Josefa

Por ela tive ternura

Não lhe foi fácil a tarefa

De viver, morreu sem cura.

Foi também muito prolífera,

Naquele tempo era assim,

Como árvore frutífera

Que dá fruto até o fim:

Eduardo, de fala mansa,

Meu tio de alta estatura,

Guardo dele na lembrança

Um caráter sem censura.

Conhecida por Das Dores,

Mas para mim Tia Nene,

Entre os meus grandes amores

Teve o seu lugar perene.

Tia Odete uma pessoa

Que viveu seus maus momentos,

Foi alegre e sempre boa,

Apesar dos sofrimentos.

Minha mãe, Maria Helena,

Nasceu numa boa hora

Mas morreu cedo, que pena!

Minh´alma até hoje chora.

A mais nova apelidada

Lulu, com muito carinho,

Uma tia muito amada

Que encontrei no meu caminho.

Vermelho da cor de cedro,

Como as espigas de milhos

Espigado, meu tio Pedro,

Teve mais de vinte filhos.

O primeiro de Etelvina

Pela quarta de Josefa,

Se apaixona, ela menina,

Conquistá-la, eis a tarefa.

Mas o tempo foi passando,

A menina foi crescendo,

O rapaz se insinuando,

A menina foi cedendo.

Nasce então um grande amor

Que o casamento acolheu

Helena – uma linda flor –

E José Bartholomeu.

A segunda geração

Sem mais demoras começa

E foi Lázaro, então,

O primeiro ator da peça.

Mas não teve muita sorte

Ou até teve, quem sabe?

É melhor que venha a morte

Antes que a vida desabe.

Logo depois vem Rodrigo,

Esse segundo vingou,

Mas não foi feliz consigo

E a vida lhe desabou.

Raymundo nasce – o mais feio,

E o menos inteligente,

Mas nunca teve receio,

Teve fé em Deus, é crente.

Nasce em seguida Etelvina,

Morreu tão cedo, por quê?

Não chegou a ser menina

Morreu ainda bebê.

Não sei se era noite ou dia,

Mas minha mãe deu à luz

Outra menina – Maria,

Nome da mãe de Jesus.

A um ano ou pouco mais

A tristeza inominável

E as conseqüências fatais:

De uma moléstia incurável,

Muito grávida, adoece

Minha mãe, jovem ainda.

Quando ao parir, desfalece,

Morrem ela e a menina.

Parece o mundo caiu

Sobre os ombros de meu pai,

Foi tanta dor que sentiu,

Que ele também quase vai.

Mas o tempo, esse remédio,

Que cura diversos males,

Curou, pouco a pouco, o tédio

Da alma de Zezinho Salles.

Depois de alguns anos triste,

A si mesmo ele promete

Levantar-se, pôr-se em riste,

Pelos encantos de Dete.

E novo dia alvorece

Na vida de seu Zezinho

Que a Bernadeth oferece

Seu amor e o seu carinho.

Sete filhos são gerados

Dessa bendita união;

Primeira dos alistados

Maria da Conceição.

O segundo é um varão

Cabra muito inteligente

Meu amigo, meu irmão,

É Geraldo, boa gente.

Nasce agora outra menina

Gente também muito boa

É a segunda Etelvina,

Casou-se com Zé Pessoa.

Em seguida vem Amaro

Atilado, perspicaz

Pra negócio tinha faro

Faleceu moço demais.

Tanto filho tendo feito,

Como meu pai, poucos vi,

Não se deu por satisfeito,

E põe no mundo Davi.

Por falta de prevenção,

Contudo pra nosso gáudio,

É gerado outro irmão

E batizado de Cláudio.

Chegou-lhe ao fim sua vida,

O câncer lhe surpreendeu,

Quase assistiu-lhe a partida,

José, que depois nasceu.

E com José se completa

A terceira geração

Prosseguindo nessa reta

Vou dar continuação

A partir de mim, que faço

Essa xucra narrativa,

Vou inserir nesse espaço

Uma só alternativa:

E como tudo começa

Com amor e atração

Não foi diferente essa

Abençoada união.

Raymundo de seu Zezinho

Se apaixona loucamente

Por Sônia de seu Tavinho

Que se casam finalmente.

Nasce logo uma menina

A mais linda da Bahia

Cheirosa como bonina

Uma flor – Rosamaria.

Nasce a robusta beleza

Em Tito, meu bom rapaz,

E eu tenho toda certeza

Que dele Deus se compraz.

Nasce agora um pregador

Com o mesmo nome do Velho,

Ele sai pregando o amor

E as novas do Evangelho.

Em Marcos, meu quarto filho,

Vi a mão de Deus pousando

E ao derramar o seu brilho

Sua luz o transformando.

Foi pra longe, além da conta,

Paulo, em busca do ideal;

Fiquei segurando a ponta

Do cordão umbilical

No meu mundo, vida a fora,

Deus operou maravilhas

E aumentou, com cada nora,

O meu número de filhas.

São mulheres virtuosas,

Meus filhos são felizardos,

Conseguiram colher rosas,

Que nunca tiveram cardos.

E como já se esperava

Com esta idade que já estou,

A turma que não brincava

Foi me fazendo vovô:

Rosa põe à luz do sol

O primeiro dos meus netos;

Gustavo encabeça o rol

Desses meus novos afetos.

É Polly que nasce agora,

Um novo e lindo arrebol,

Ela traz a luz da aurora,

E a alegria de um sol;

É como o ruflar de asa

Um riso nos lábios seus,

Enche de som nossa casa;

Que riso! graças a Deus.

Ao sopro leve da brisa

Uma cegonha encantada

Aterrissa com Luisa

Numa fresca madrugada.

E Tito põe mais um elo

Nessa corrente de amor

Tal qual o pai é Marcelo

Sem tirar, sem nada por.

Mariana foi Deus que trouxe,

E perdão pedindo estou,

Se não pude ser pai doce

Como deve ser o avô.

Espero que o mal que fiz

Não tenha feito bem feito

E que o bem que sempre quis

O tenha feito direito.

Daniel esse é atleta,

Mesmo até que não pareça,

Mas o gol é sua meta,

Tem a bola na cabeça.

De Andréa e de Mundinho

Nasce Lucas – o primeiro –

Se antes pequenininho,

Já esta ficando um guerreiro.

Luciana é um primor,

Também filha de Mundinho,

Mundinho, aquele pastor,

Que tem todo meu carinho.

Nasce agora o nono neto,

Alvo de nossa atenção,

Risonho, lindo e dileto,

Filho de Marcos – João.

Como sol de uma alvorada,

Como as primícias do dia,

Alegre qual passarada,

João Marcos é alegria.

Se menina ou se menino,

Joãozinho está esperando

Um irmão bem pequenino,

Que Ângela está gerando.

Meus amores meus afetos,

Para fazer outra estrofe,

Que nos cheguem os bisnetos

Antes que eu morra,ou mofe.

25/11/06

Raymundo de Salles Brasil
Enviado por Raymundo de Salles Brasil em 21/03/2007
Reeditado em 09/07/2009
Código do texto: T420774