Cantigas de Ninar
Por favor, filha,
Olhe nos meus olhos e diga
Mesmo que mentira for.
Que não é ódio, nem desprezo,
nem vergonha, nem mágoa
este seu jeito indiferente
ma humorado, inconsequente
no ontem, no hoje, no presente,
que me causa medo, receio, desespero e dor.
Desconfortável e desconcertante
Desesperadamente, pressinto que
a minha presença a incomoda.
Então busco uma forma de ficar ausente
Deixá-la voar livre, sem nada pedir.
Quem sabe virar poeira de estrelas,
para nenhum incômodo lhe causar.
Na verdade, até hoje não vivi.
Mas, ainda não morri e por isso
minha vida eu daria
para todo dia vê-la sorrir...
Mas viver assim, nesta agonia...
Solidão, sem amor. Silenciosas madrugadas...
No seu olhar, o vazio, a impaciência, às vezes
desdenho, neste seu jeito de ser.
De sua rotina, suas dúvidas, seus sonhos e desejos
alienada, nada sei.
Quisera eu ser famosa.
Altiva, culta, versátil, inteligente.
Delicada, perfumada, uma rosa
daquelas de cores intrigantes,
sem espinhos. Elegante.
Cantando cantigas de ninar...
Quem sabe, assim você de mim se orgulhasse...
Mas a vida transformou-me neste farrapo.
Inútil. Sem serventia, obsoleto, fútil.
Sem porte, sem suporte.
Repetitiva. Sem nada a oferecer...
Mas até esta vida inútil
Eu daria
Só para vê-la sorrir.