Desfile de lembranças
Não, os odores intestinos maternos
não marcaram a memória.
O coração de filho não o permitiu.
O revolver o “baú da audição”, sim,
desvela a intimidade do lar
de falsos brasões na parede
aonde envelhecia um relógio
que tocava as horas, ingênuo,
sonhando um dia ser cuco.
A memória se faz viva
marcada por sons intestinos
daquela a quem meu coração negou odores.
Um lar que o tempo calmamente desfez
no desenho universal de lembranças
de mãe que imagina saber ocultar
escolhas entre pretensos iguais da prole
na divisão do pouco com muitos à mesa.
Retrato da memória, desfile de lembranças
que invade a manhã cedo com luz e dor,
aquela dor crua que machuca o peito,
murcha para a eternidade o coração
e paralisa a alma por dias a fio com
a felicidade sempre à frente dobrando
a esquina a sumir sem rastros,
indiferente.